LUCAS RODRIGUES
ESPECIAL PARA O MIDIAJUR
O julgamento da Ação Penal 470 no Supremo Tribunal Federal, popularmente conhecida como "Mensalão", foi, sem sombra de dúvida, o fato jurídico do ano. A ação já entrou para a história como o maior julgamento da Corte, com 53 sessões conduzidas durante mais de quatro meses.
O que era para ser um julgamento de grande repercussão foi tratado pela mídia e população como uma espécie de espetáculo. A conduta dos ministros na análise dos processos e na proclamação dos votos se transformou em novela, onde o que mais chamava a atenção não era o conteúdo dos autos, e sim a “performance” dos ministros em suas constantes brigas, discussões e insinuações que se arrastaram até o final do julgamento, no dia 17 de dezembro
A figura do ministro relator Joaquim Barbosa, que passou a ser o presidente da Corte, foi popularizada ao ponto de ser considerado “herói” para a população, enquanto o revisor Lewandowski era visto pelo povo como o "vilão" que absolvia os corruptos, ao contrário da classe jurídica, que, muito mais técnica, observava e criticava erros proferidos por ambos os ministros. Barbosa e Lewandowski com suas constantes divergências na análise do caso ofuscaram o (porque não) “brilho” dos acusados.
O esquema de corrupção foi denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB). Segundo ele, diversos parlamentares recebiam pagamentos mensais para votar projetos de acordo com a vontade do governo Lula. A denúncia oficial foi formulada pela Procuradoria-Geral da República e apontava cerca de 40 pessoas envolvidas no esquema e em 2007 o STF aceitou a denúncia.
"O ministro Joaquim Barbosa foi popularizado ao ponto de ser considerado “herói” para a população, enquanto o revisor Lewandowski era visto pelo povo como o "vilão" que absolvia os corruptos"
Confira abaixo a retrospectiva do julgamento do mensalão:
O início
O julgamento do Mensalão começou na tarde do dia 02 de agosto. Logo no início começou o primeiro de tantos bate-bocas travados entre o ministro Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski. Lewandowski votou a favor do desmembramento do processo, o que irritou Barbosa, que chegou a acusar o colega de ser “desleal”. O pedido de desmembramento foi feito pelo advogado Márcio Thomaz Bastos, que defende o ex-dirigente do Banco Rural José Roberto Salgado, porém, por nove votos a dois, o STF negou o pedido.
Acusação
No dia 03, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, apresentou os argumentos da acusação contra os 38 réus do processo. Gurgel afirmou que tentaram intimidá-lo com ondas de ataques e pediu que assim acabado o julgamento, que os réus condenados sejam imediatamente presos.
Defesa
A argumentação dos advogados de defesa dos réus iniciou no dia 06 de agosto. Neste dia foram apresentadas a defesa do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu; do ex-presidente do PT, José Genoíno; de Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT;do publicitário Marcos Valério e do sócio de Valério, Ramon Hollerbach. Os advogados admitiram a existência de Caixa Dois para justificar a movimentação de dinheiro, mas negaram as demais acusações da Procuradoria-Geral da República.
As demais defesas foram apresentadas até o dia 15 de agosto. Os advogados apostaram em frases de efeito para chamar a atenção da Corte do Supremo, como no caso de Leonardo Yarochewsky, defensor de uma das funcionárias de Valério, que durante a sessão ironizou a banalização do crime de formação de quadrilha citando a novela Avenida Brasil, da TV Globo.
“"Até a Carminha diz que vai processar a Nina por formação de quadrilha", disse o advogado.
Outro fato curioso foi a vestimenta do advogado de Roberto Jefferson, Luiz Barbosa. Ele fez a defesa trajando calças jeans, o que foge ao regimento do plenário e quase foi barrado por um segurança. Luiz também causou polêmica ao pedir para que o STF incluísse o ex-presidente Lula no banco dos réus, que negou o pedido.
Visita 'ilustre'
No último dia destinado às sustentações orais dos advogados que defendem os réus, o líder religioso Inri Cristo, que se diz a reencarnação de Jesus Cristo, fez um protesto em frente ao STF, junto com suas seguidoras, pedindo justiça na resolução do caso.
OAB repudia ato de Barbosa
O presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante,no dia 16 de agosto lamentou a posição do ministro Joaquim Barbosa, que solicitou durante sessão do julgamento do Mensalão que a Corte enviasse à OAB representação contra três advogados que pediram sua suspeição para julgar o processo. Ophir assinou uma nota repudiando o ato, pois para ele a “tentativa de calar e intimidar a advocacia não é passível com a democracia”.
Votos de condenação e absolvição
Os ministros iniciaram no dia 16 de agosto a análise dos votos. Mais uma vez, houveram divergências entre Barbosa e Lewandowski. Barbosa queria que o julgamento fosse “fatiado”, ou seja, divido em núcleos. Lewandowski não gostou da proposta e os dois discutiram durante a sessão. O então presidente do STF, Ayres Britto, propôs que toda a Corte decidisse sobre a forma de julgar o caso. No dia 19 de agosto, o Supremo optou pelo julgamento em núcleos, conforme a metodologia de Barbosa.
A primeira fase dos votos encerrou no dia 30 de agosto e condenou o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e o do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Já Luiz Gushiken, ex-ministro da Secretaria de Comunicação do governo Lula, foi absolvido por unanimidade do crime de peculato. Essa data também foi marcada pela despedida do ministro Cézar Peluso, que se aposentou ao completar 70 anos, idade máxima para permanecer na corte.
Durante todo o mês de setembro, outubro e metade de novembro, os ministros analisaram e votaram pela condenação ou absolvição dos réus do processo pelos diversos crimes pelos quais eram acusados, em itens divididos por cada núcleo.
No dia 10 de outubro, Ayres Britto se aposenta e Joaquim Barbosa toma posse como o primeiro negro a presidir o STF no Brasil. O ministro Dias Toffoli é criticada pela imprensa por já ter advogado para o PT, mas não recua e continua a julgar o caso. Barbosa e Lewandowski divergem sobre as condenações e, posteriormente, sobre as penas aplicadas aos réus.
"Os deputados envolvidos no esquema foram condenados: João Paulo Cunha (PT-SP), a nove anos e quatro meses; Valdemar Costa Neto (PR-SP), a sete anos e 11 meses; e Pedro Henry (PP-MT), foi condenado a sete anos e dois meses"
No dia 07 de novembro, o STF decide apreender o passaporte dos condenados, para evitar que fujam do país. Neste mês, nomes como José Dirceu, José Genoíno e Delúbio Soares são condenados pela participação no esquema e têm suas penas definidas.
A conclusão do julgamento ocorreu no dia 17 de dezembro e, assim como começou, também terminou em bate-boca, desta vez entre Barbosa e o ministro Celso de Mello. Mello criticou Barbosa por fazer agradecimentos pessoais durante a sessão e, com o continuar dos agradecimentos, se retirou do plenário.
Além de condenar 25 réus e absolver 12, o STF também decidiu pela cassação de mandatos dos deputados envolvidos no esquema, no caso os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), condenado a nove anos e quatro meses; Valdemar Costa Neto (PR-SP), punido com sete anos e 11 meses; e Pedro Henry (PP-MT), condenado a sete anos e dois meses. O ex-deputado e atual prefeito de Jandaia do Sul (PR), José Borba, não foi afetado pela decisão.
Prisão
O Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, pediu ao Supremo, no dia 19 de dezembro, que determinasse a prisão imediata dos acusados, mas o pedido foi negado pelo presidente da Corte, Joaquim Barbosa, que justificou com a afirmação de que o plenário decidiu ser "incabível o início da execução penal antes do trânsito em julgado da condenação”.
Confira abaixo a lista de condenados do Mensalão e suas respectivas penas:
Marcos Valério: Formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. 40 anos, 1 mês e 6 dias de prisão + multa de R$ 2,8 milhões
Ramon Hollerbach: Evasão de divisas, corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e formação de quadriha. 29 anos, 7 meses e 20 dias de prisão + multa de R$ 2,8 milhões.
Cristiano Paz: Formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato e lavagem de dinheiro. 25 anos, 11 meses e 20 dias de prisão + multa de R$ 2,5 milhões.
Simone Vasconcellos: Formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e evasão de divisas. 12 anos, sete meses e 20 dias de prisão + multa de R$ 374 mil.
Rogério Tolentino: Corrupção ativa, peculato, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. 6 anos e 2 meses + multa de R$ 404 mil
José Dirceu: Corrupção ativa e formação de quadrilha. 10 anos e 10 meses de prisão + multa de R$ 676 mil.
José Genoíno: Corrupção ativa e formação de quadrilha. 6 anos e 11 meses de prisão + multa de R$ 468 mil;
Delúbio Soares: Corrupção ativa e formação de quadrilha. 8 anos e 11 meses de prisão + multa de R$ 300 mil
Katia Rabello: Formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta de instituição financeira e evasão de divisas. 16 anos e 8 meses de prisão + multa de R$ 1,5 milhão
José Roberto Salgado: Formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta de instituição financeira e evasão de divisas. 16 anos e 8 meses de prisão + multa de R$ 926 mil.
Vinícius Samarane: Lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta de instituição financeira. 8 anos, 9 meses e 10 dias de prisão + multa de R$ 598 mil.
Brenop Fischberg: Lavagem de dinheiro. 5 anos e 10 meses + multa de R$ 528 mil.
Enivaldo Quadrado: Lavagem de dinheiro. 3 anos e 6 meses + multa de R$ 26.400
José Cláudio Genu: Lavagem de dinheiro e corrupção passiva. 5 anos + multa de R$ 480 mil
Jacinto Lamas: Formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e corrupção passiva. 5 anos + multa de R$ 240 mil
Henrique Pizzolatto: Peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 12 anos e 7 meses + multa de R$ 1,272 milhão
José Borba: Corrupção passiva. 2 anos e 6 meses + multa de R$ 360 mil
Carlos Alberto Rodrigues: Corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 6 anos e 3 meses + multa de R$ 696 mil
Romeu Queiroz: Corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 6 anos e 6 meses + multa de R$ 792 mil
Valdemar Costa Neto: Corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 7 anos e 10 meses + multa de R$ 1,08 milhão
Pedro Henry: Corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 7 anos e 2 meses + multa de R$ 888 mil.
Pedro Corrêa: Corrupção passiva e lavagem de dinheiro. 7 anos e 2 meses + multa de R$ 1,08 milhão
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