FOLHA DE S. PAULO
Depois de passar pelo gabinete de três ministros em seis anos, uma denúncia contra o senador Valdir Raupp (RO), hoje presidente do PMDB, foi aceita pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
Raupp é acusado de responsabilidade por um desvio de R$ 6,4 milhões que teria ocorrido quando ele era governador de Rondônia.
O primeiro ministro que teve contato com o caso foi Joaquim Barbosa, designado relator em 2004, depois de a Procuradoria-Geral da República pedir ao Supremo que acolhesse a denúncia.
Ele levou três anos para concluir o voto e acolher o pedido para abrir a investigação do senador, o que permitiu que o caso enfim entrasse na pauta do tribunal.
Foi quando o ministro Gilmar Mendes pediu mais tempo para analisar o caso, suspendendo a discussão no plenário. Ele demorou um ano para chegar a uma conclusão e votou contra a denúncia.
Em seguida, chegou a vez do ministro Menezes Direito, morto em 2009. Ele também pediu mais prazo, e outros sete meses se passaram até que o processo voltasse a andar. A denúncia foi acolhida somente em 2010.
Essa demora para tomar decisões necessárias para o andamento de investigações que envolvem políticos é justificada, segundo os ministros da corte, pela sobrecarga de trabalho.
Para superar o problema, dois deles dizem que a solução é acabar com o foro privilegiado a que alguns políticos têm direito no Supremo.
De acordo com a Constituição, senadores, deputados federais e ministros só podem ser processados e julgados por crimes no Supremo.
Só os ministros do tribunal podem decidir sobre buscas de provas, depoimentos de testemunhas e interrogatórios dos réus nesses casos. Encerradas as investigações, apenas eles podem julgar os acusados.
O acúmulo de casos com foro privilegiado é um problema relativamente novo para o STF. Até 2001, a abertura de processos desse tipo dependia de autorização do Congresso. Como poucos recebiam o sinal verde, o volume de casos era insignificante.
Depois que a autorização prévia deixou de ser uma exigência legal, o efeito se fez sentir rapidamente. Entre 1988 e 2001, 21 processos foram abertos no STF. Hoje há mais de 580 inquéritos e ações penais em andamento.
De acordo com um estudo recente da Fundação Getulio Vargas, o tribunal recebeu 1,2 milhão de novas ações de toda espécie entre 1988 e 2009, das quais 92% eram recursos.
A maioria dos processos analisados pela Folha se arrasta há anos, à espera da conclusão de investigações adicionais requisitadas pelo Ministério Público e depoimentos de testemunhas.
Para autorizar um pedido da Procuradoria-Geral da República numa ação em que o deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT) é réu, o ministro Celso de Mello levou um ano e oito meses. A Procuradoria queria que o STF validasse atos do tribunal de primeira instância em que o caso começou e determinasse o interrogatório dos acusados.
O ministro Celso de Mello diz que atrasos como esse ocorrem por causa do excesso de trabalho e defende a extinção do foro privilegiado.
O ministro Marco Aurélio Mello, que levou seis meses para dar um despacho num inquérito que envolve o deputado Geraldo Simões (PT-BA), também quer o fim do privilégio. "Ficamos aqui apagando incêndios", diz ele. "A sobrecarga é desumana."
O presidente do STF, Cezar Peluso, demorou cinco meses para requisitar informações e mandar ouvir testemunhas numa investigação sobre o uso indevido de uma rádio comunitária pelo deputado Edio Lopes (PMDB-RR).
Erros também contribuem para a morosidade. Num inquérito sobre atos cometidos pelo senador Lindbergh Farias (PT-RJ) quando era prefeito de Nova Iguaçu (RJ), o Supremo perdeu um mês ao enviar para o endereço errado um ofício que era destinado ao Tribunal de Contas do Estado do Rio.
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