LAICE SOUZA
DA REDAÇÃO
O corregedor-geral da Justiça, Márcio Vidal, na entrevista especial da semana concedida ao MidiaJur, afirmou que a existência de uma taxa de congestionamento de processos em 82%, anunciada pelo próprio presidente eleito do Tribunal de Justiça, desembargador Orlando de Almeida Perri, ao próprio site, veiculada no dia 19 de novembro (Veja AQUI), causou um "efeito catastrófico na realidade jurisdicional do Estado. "Contudo, as providências adotadas hão de superar essa questão”.
Ainda segundo o corregedor, embora a notícia seja negativa e chega a ser desmotivadora. É plenamente compatível com a realidade à época considerada.
“Hoje a realidade, ainda que exija melhorias, é bem outra. Em primeiro lugar, cabe lembrar que, em 2010, de um lado, houve uma longa e desgastante greve dos servidores do Judiciário, o que, evidentemente, provocou interrupção e atrasos na prestação jurisdicional e, de outro, aquele foi um ano eleitoral (estadual e federal), período em que significativo número de magistrados permanece na jurisdição eleitoral, por, no mínimo, 60 dias. Pergunto: quem impulsiona os processos da Justiça Comum durante esse período? E os atos processuais, quem os cumpre?”, ressaltou.
Na entrevista, o desembargador comenta ainda sobre os avanços conquistados pela corregedoria em 2012, principalmente no que diz respeito aos mutirões realizados em quase todas as comarcas do Estado. Conforme os dados foram movimentados 326.181 processos, em 106 varas. Desse total, 13,220 foram arquivados.
“É evidente que, independentemente, da satisfação das expectativas de cada um dos jurisdicionados, em face da movimentação de seu processo ou até de uma decisão, há muito esperada, os números, globalmente considerados, são significativos e dão a dimensão tanto da demanda, quanto do acervo acumulado, movimentadas nos referidos mutirões”, asseverou Vidal.
Veja abaixo os melhores trechos da entrevista:
MidiaJur - Como o senhor analisa a divulgação de que, no Estado, a taxa de congestionamento nos processos que tramitam na Primeira Instância é de 82%?
Márcio Vidal - A notícia é negativa. Chega a ser desmotivadora. No contexto em que tudo ocorreu, ela é compatível com a realidade à época considerada. Hoje a realidade, ainda que exija melhorias, é bem outra. Em primeiro lugar, cabe lembrar que, em 2010, de um lado, houve uma longa e desgastante greve dos servidores deste Judiciário, o que, evidentemente, provocou interrupção e atrasos na prestação jurisdicional e, de outro, aquele foi um ano eleitoral (estadual e federal), período em que significativo número de magistrados permanece na jurisdição eleitoral, por, no mínimo, 60 dias. Pergunto: quem impulsiona os processos da Justiça Comum durante esse período? E os atos processuais, quem os cumpre? Não é demais lembrar que, em dados objetivos, o deficit, já referido anteriormente, durante o período avaliado, beirava a casa de 600 servidores e de 60 juízes. Diante de tamanha deficiência, lógico que a tendência é de acumulação do acervo, não só pela deficiência já mencionada, mas, também, pelo crescimento acelerado da demanda. Tais condições foram, indiscutivelmente, determinantes da produtividade de 2010 e 2011, divulgada em 2012. Somente neste exercício de 2012, resolvidas questões orçamentárias prévias, pôde o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Rubens de Oliveira Santos Filho, determinar a nomeação de candidatos concursados em 2008, mesmo assim em número insuficiente, em decorrência de limitações financeiras. Já entre magistrados, foram nomeados 43 que tomaram posse em maio passado. Como esperar melhores resultados? Não precisa ser expert no assunto para saber que o resultado divulgado é perfeitamente justificável. Com certeza, os resultados dos exercícios subsequentes serão outros, muito diferentes daqueles, em face das correções implementadas e dos esforços adicionais, do ponto de vista dos investimentos. Concordo com o fato de que a notícia, despida de qualquer explicação, em face do contexto em que as atividades foram desenvolvidas, causou impacto catastrófico e humilhante para este Estado. Contudo, as providências adotadas hão de superar essa questão. É que, em casos como este, para garantir a celeridade na tramitação dos feitos, é necessário zerar o acervo remanescente e atualizar a tramitação da demanda atual, objetivo que tem sido enfrentado com os mutirões.
"Como minorar o problema? Em primeiro lugar, faz-se necessário despertar no conjunto da sociedade uma mudança de atitude"
MidiaJur - Como está o processo de transição com o corregedor eleito?
Márcio Vidal - A transição começou logo após a eleição, a partir da semana seguinte, e a Corregedoria disponibilizou uma sala para que operassem as ações necessárias à transmissão não só do cargo, mas sua sucessão ocorra sem maiores dificuldades, de modo que todo o órgão funcione, com todos os seus setores, sem solução de continuidade. O eminente desembargador Sebastião de Moraes já esteve na Corregedoria para conhecer sua estrutura, organização e funcionamento, e da mesma forma o fizeram seus futuros Juízes Auxiliares. Na oportunidade, o desembargador indicou o atual coordenador da Secretaria da Corregedoria para fazer parte da sua equipe de transição, motivo pelo qual participa de todas as reuniões. Dessa maneira, esse processo segue seu ritmo normal e harmonicamente.
MidiaJur - Como o senhor avalia a atuação da Corregedoria em 2012? Márcio Vidal - A Corregedoria, como órgão de raiz do Judiciário, com papel delimitado na legislação, para orientar, fiscalizar, idealizar e implementar instrumentos de gestão do 1º grau de jurisdição, a meu sentir, neste ano de 2012, esteve melhor do que no ano passado, pelo fato de que a equipe de trabalho amadureceu e mostrou atuação melhor sintonizada. Diria, como em outros campos, em ritmo mais harmônico, por isso, produziu mais e melhor. Cabe aqui lembrar que a Corregedoria tem sob sua responsabilidade não só a jurisdição administrativa de 1º grau, mas, também, a jurisdição social, o que implica a implementação e a manutenção de programas sociais e preventivos.
MidiaJur - Dá para dizer que conseguiu atingir as metas e objetivos propostos?
Márcio Vidal - Em linhas gerais, penso que sim. O quadro de controle das ações voltadas para os diferentes projetos e respectivas metas dá conta de que, do volume previsto: das ações iniciais, constantes do Planejamento Estratégico, foram cumpridas, integralmente, 73,17%, estão em andamento 14,63% e atrasadas ou sobrestadas 12,20% ; e das ações novas, implementadas após o Planejamento Estratégico, 68,33% foram concluídas, 20,00% estão em andamento e 11,67 estão atrasadas ou sobrestadas. Numa visão mais departamentalizada, é possível destacar que todos os setores da Corregedoria apresentaram produtividade bem acima da média, tendo em vista suas ações rotineiras e os projetos implementados. Além disso, esta Gestão atuou dentro de seus limites administrativos, mantendo o cumprimento de suas metas, em consonância com aquelas do CNJ, com destaque para as voltadas para acelerar a prestação jurisdicional, para a redução do tempo de tramitação processual, para o atendimento às crianças e adolescentes em risco, e carentes, processos de adoção, processos de ressocialização etc.
MidiaJur - Muitos mutirões foram realizados neste ano, qual o resultado para a população, teve eficácia?
Márcio Vidal - Foram realizados mutirões em 106 Varas das diversas Comarcas de Mato Grosso, incluindo algumas da Capital. No total fez-se a movimentação de 362.181 processos, numa média aproximada de 3.420 processos por Vara. Além disso, cerca de 13.220 processos foram arquivados. Esses números revelam que esta Corregedoria promoveu, no primeiro grau de jurisdição, esforços adicionais, com vistas ao cumprimento da missão do Judiciário, buscando atualizar e imprimir maior celeridade à prestação jurisdicional nessa instância. Nesse sentido, esta Corregedoria efetivou ações de colaboração com as diversas Varas, para descongestionar o aparelho judiciário e, com isso, favorecer a prestação jurisdicional. É evidente que, independentemente, da satisfação das expectativas de cada um dos jurisdicionados, em face da movimentação de seu processo ou até de uma decisão, há muito esperada, os números, globalmente considerados, são significativos e dão a dimensão tanto da demanda, quanto do acervo acumulado, movimentadas nos referidos mutirões.
MidiaJur - Como o senhor analisa o poder de investigação de um corregedor, falta autonomia?
Márcio Vidal -
"A investigação de um corregedor tem limites constitucionais"
A sindicância é de natureza investigativa, destinada a verificar se o fato imputado como irregularidade cometida pelo magistrado no exercício de suas atribuições é verossímil, ou seja, examinar, tão só e exclusivamente, se há justa causa para instauração do processo administrativo disciplinar. Nessa sindicância, não se afirma se o magistrado é, ou não, culpado. Nela, define-se se há, ou não, necessidade de aprofundar a investigação. O instrumento legal de que dispõe o corregedor é suficiente para dar conta de uma investigação? Respondo que não, tanto que sugeri ao senador Pedro Taques e a outros parlamentares que se editasse uma lei, municiando o corregedor com instrumentos mais eficazes, para a investigação de fatos que estão sob jurisdição. De qualquer sorte, no processo administrativo que será dirigido por um desembargador no Tribunal Pleno, este terá mais condições de aprofundar a investigação, em busca da veracidade dos fatos averiguados, com vista a que o veredicto será justo, seja para aplicar sanção, seja para absolver.
MidiaJur - Das sindicâncias abertas pela Corregedoria contra magistrados qual o resultado prático disso? Conseguiu descobrir a existência da prática de alguma conduta alheia à função do magistrado, ou foram representações infundadas?
Márcio Vidal - A grande maioria das representações contra magistrados e que chegam à Corregedoria, seja diretamente, seja por remessa do CNJ, prende-se a excesso de prazo, o que, frequentemente, tem como causa a falta de infraestrutura nas Comarcas ou nos Juizados. Em muitas das vezes, ao prestar as informações de praxe, no contraditório, o magistrado comprova que já prolatou sentença ou já movimentou o processo. Poucas são aquelas representações que justificam a abertura de sindicância e, dentre as sindicâncias concluídas, raras são aquelas de que resulta um processo administrativo disciplinar, cujo julgamento pelo Tribunal Pleno leva, ou não, à penalização administrativa do magistrado. A Corregedoria, nesse particular, também tem cumprido sua missão. Desde o início da gestão foram 34 representações, 113 pedidos de providências, 26 reclamações, 58 pedidos de informação, 20 sindicâncias; seis comunicações, cinco exceções de suspeição e quatro procedimentos preliminares investigativos. No total das sindicâncias, 16 foram remetidas para o departamento do Tribunal Pleno para julgamento. Desse número, 10 foram abertas nesta gestão.
MidiaJur - Na avaliação do senhor, como está a Justiça de Primeira Instância? O que evoluiu em 2012 e o que falta evoluir para conseguir a tão sonhada prestação célere?
Márcio Vidal - Essa questão envolve dimensão considerável. Começaria pela estrutura organizacional que está em descompasso com a realidade social, ou seja, para atender a uma demanda acelerada e crescente, o Judiciário apresenta um quadro deficitário, tanto no que diz respeito aos recursos humanos (magistrados e servidores), quanto do ponto de vista de instalações (espaço físico e equipamentos), o que exige um investimento bem maior, para atender adequadamente às demandas dos jurisdicionados. Sem dúvida, o deficit de magistrados e de servidores vem-se arrastando há mais de uma década, o que acarreta, obviamente, prejuízos à prestação jurisdicional. Como minorar o problema? Em primeiro lugar, faz-se necessário despertar no conjunto da sociedade uma mudança de atitude, em face da resolução dos conflitos, ou seja, precisa esta alcançar outro patamar de civilidade que passa pela mudança cultural, pela mudança de mentalidade, pela adoção de modos consensuais para resolver questões, pela mediação e pela conciliação. O que ocorre hoje? Quase tudo cai no Judiciário: das pequenas causas às questões mais complexas. Se houve um tempo em que os cidadãos quase não recorriam à Justiça, para resolver algum litígio, por falta de informação, hoje há excesso de demanda, de sorte que, nos tempos atuais, tem prevalecido a litigiosidade, a partir mesmo da própria formação dos profissionais do Direito. Essa primeira dificuldade deve ser objeto de um trabalho educacional intenso que não se faz de uma hora para outra e, tampouco, seus resultados são imediatos. Exige, além disso, vontade política, ações voltadas especialmente para esse aspecto e, sobretudo, tempo: perspectiva histórica que vai da ação a seus resultados a longo prazo.
Enquanto não vencido esse primeiro destaque, pergunta-se: há mais a ser feito? Quais procedimentos devem ser adotados? Nesse particular, entendo que é necessário alto investimento em novas tecnologias, sempre visando alcançar maior celeridade na prestação jurisdicional. Isso requer, ao mesmo tempo, capacitação continuada de magistrados, de servidores e de outros atores do sistema judicial. Esse “pacote” envolve o despertar da responsabilidade e do compromisso individual e institucional, de cada um e de todos, no conjunto globalmente considerado, haja vista a complexidade do mundo contemporâneo, ao qual receitas adotadas para sanar males de outrora não mais lhe servem.
É preciso repensar, refletir, projetar soluções mais adequadas às novas realidades.
"No caso do Judiciário, é preciso desenhar, propor um novo modelo de estrutura organizacional"
, pois como um dos esteios da estrutura estatal, conjuntamente com outras instituições, deve desempenhar suas atividades a contento para a sociedade. Portanto, muito foi feito, mas muito há ainda a se fazer. Diria até que as ações institucionais não se esgotam e, ao longo dos anos, precisam ser revistas e moldadas, de forma a atender aos interesses da coletividade, gerais, de todos. O sonho é algo muito distante e implica ideais que variam de sociedade para sociedade. Por exemplo: na sociedade americana, o Judiciário é visto de forma diferente daquela que prevalece nos países sul-americanos. Lá, os agentes públicos são respeitados, considerados honrados, idealistas e patriotas. Ocorre isso no Brasil? Lógico que o viés cultural é decisivo.
Veja-se, só para citar um exemplo bastante corriqueiro, o comportamento do brasileiro no trânsito. As infrações constituem a regra. Isso evidencia a falta de civilidade, do que decorre o fato de que quem está ao volante descumpre sistematicamente as normas, desde dirigir atendendo celular, até avançar sinal e faixa de pedestres, ultrapassar em local proibido, ultrapassar o limite de velocidade estabelecido, ultrapassar pelo acostamento etc. Tudo isso, a troco de ser “esperto”. Sua própria vida e a dos outros ficam relegadas a um irresponsável segundo plano. Tirar vantagem sobre o outro parece-lhe mais importante. Enquanto isso, a vida continua em risco, e o veículo sai da categoria de meio de transporte para ser utilizado como uma arma e, como tal, perigosa, ameaçadora. As trágicas estatísticas falam melhor dessa “mania” nacional.
A mudança cultural e comportamental, em relação aos cidadãos, é, pois, essencial. Obviamente, nesse processo, os agentes políticos precisam adquirir e exercitar novas concepções de mundo e de vida, para mudar as instituições. Enfim, que a passagem de um para outro ano não seja apenas “virar” a folhinha do calendário.
MidiaJur - Do trabalho que o senhor realizou, o que orienta o próximo gestor a dar continuidade e por qual o motivo?
Márcio Vidal - Cada gestor, de acordo com sua experiência e visão de mundo, dá destaque a determinadas áreas e atividades, ainda que, em se tratando de Corregedorias, é necessário priorizar, na prática, tudo, simplesmente porque sob sua responsabilidade ficam o controle e supervisão das atividades judicantes da primeira instância ou de primeiro grau de jurisdição, o que implica uma visão sistêmica. Em todo caso, apontaria a necessidade de priorizar projetos de tecnologia, além de dirigir um olhar especial para os cartórios extrajudiciais que prestam um serviço mais amplo do que o alcance da Corregedoria. Neste particular, não é demais lembrar que não há nenhum ser humano neste mundo que, ao nascer ou ao morrer, não precise dos serviços de um tabelião.
MidiaJur- O que esperar do desembargador Márcio Vidal na vice-presidente do Tribunal de Justiça em 2013?
Márcio Vidal - Minha atenção está voltada não para o que esperam do desembargador Márcio Vidal na Vice-Presidência do Tribunal de Justiça, mas, sobretudo, para o que devo fazer no exercício desse cargo. Dedicação ao trabalho, com ética, e a busca insistente, persistente e incansável pelo aperfeiçoamento jurídico que a liturgia do cargo impõe, constituem meus fundamentos, meus princípios, enfim, minha base, a partir da qual procurarei cumprir minha missão. Essa minha nova função, que assumirei em março de 2013, diferentemente da Corregedoria, que tem atividade de maior extensão, notadamente administrativa e social, restringir-se-á à jurisdição jurídica e às missões que, no entender do desembargador Orlando Perri – presidente eleito que também tomará posse em março próximo –, devam ser por mim capitaneadas, como coadjuvante na nova administração deste Tribunal. Por derradeiro, registro aqui que, com auxílio dos colegas e dos servidores, espero poder desempenhar a nova futura missão a contento, sempre tendo como objetivo atender aos interesses maiores da sociedade, enfim, dos jurisdicionados.
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