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GERAL Domingo, 18 de Dezembro de 2022, 08:00 - A | A

18 de Dezembro de 2022, 08h:00 - A | A

GERAL / DENÚNCIA DE CACICA

Fazendeiros colocaram esterco no leite para expulsar indígenas em Mato Grosso

Liderança indígena da etnia Bororo relata episódios de ameaças e intimidações em aldeia localizada em Poxoréu

ALLAN PEREIRA
Da Redação



Quando tinha 14 anos, a cacica Maria Aparecida, líder na Terra Indígena Jarudore em Poxoréu (a 251 km de Cuiabá), saiu do território dos seus avós por conta das constantes ameaças sofridas aos Bororos da comunidade. A liderança indígena, que hoje tem 64 anos, conta que uma das formas que os fazendeiros agiam para expulsá-los da região era colocar esterco e pedras no leite deles. O avô de Maria era cacique na aldeia.

“Não aguentei a pressão. Meus avós sempre foram muito ameaçados. Eles [fazendeiros] passaram atirando para todo o lado. Meu avô ia buscar leite também e, quando ia fervê-lo, tinha esterco, tinha pedra. Não era que caiu; era para dizer que estava cheio”, disse Maria.

O Distrito de Jarudore é alvo de uma ação de desintrusão pelo Ministério Público Federal (MPF) proposta em 2007. O processo de desocupação da área de 4,7 mil hectares, com cerca de 200 famílias,  está parado desde agosto de 2019. Os Bororos aguardam o julgamento de um recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).

Maria Aparecida fez um relato ao MidiaJur durante participação em audiência pública realizada na sede das Promotorias do Ministério Público, em Cuiabá, sobre violência no campo e violência contra defensores dos direitos humanos em Mato Grosso.

As palestras foram organizadas pelo Centro de Apoio Operacional de Defesa dos Direitos Humanos, Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania e o Centro de Direitos Humanos Dom Máximo Biennes. O evento ocorreu durante toda a manhã desta segunda-feira (12).

Sobre o episódio do esterco no leite, a liderança acrescenta que os fazendeiros pediam para seu avô não abrir o recipiente com a bebida. Caso contrário, eles iriam derrubar na frente dele. As substâncias só eram encontradas quando já estavam na aldeia.

“Foram tantas coisas que passamos ali. Falei para o meu pai que queria ir embora. Ele [avô] não queria que eu fosse, mas eu fui e falei que ia voltar”, relata.

Allan Pereira/MidiaJur

Cacica Jarudore

 Cacica Maria Aparecida participa de encontro na sede do Ministério Público.

Retorno como cacica - Maria voltou em 2005, já como cacica, sucessora do seu pai. Durante o tempo que esteve morando em aldeias vizinhas, ela ajudou o pai na tarefa de liderar os Bororos da TI Jarudore. Quando retornou para terra dos seus antepassados, os indígenas pediram que ela permanecesse na liderança, que havia sido do seu pai e do seu avô.

“Não é tão fácil ser cacique. O prefeito ganha um dinheiro, mas não cuida do povo. Ser cacique é ter que cuidar do povo sem ter nada de dinheiro. Na aldeia, o cacique é aquele que come por último e tem que dar de comer ao povo. Não é como se vê um mendigo na cidade, coitado, sem comer e o prefeito não está nem aí. Dentro da aldeia, não pode ser assim. Você tem que cuidar do seu povo”.

A TI Jarudore foi demarcada pela primeira vez pelo Marechal Cândido Rondon, em 1912, com uma extensão de cerca de 100 mil hectares. Em 1940, a área começou a ser ocupada por fazendeiros, que expulsaram os índios Bororos do território. Em 1945, um decreto estadual reduziu a terra indígena a 6 mil hectares para usufruto dos Bororo. Seis anos mais tarde, em 1951, o então Departamento de Terras e Colonização do Estado de Mato Grosso (hoje Intermat) reduziu mais uma vez a área para 4,7 mil hectares.

Maria Aparecida relata que, nos seus anos iniciais como cacica, foram muitos episódios de intimidações e ameaças. Cita que até policiais militares realizaram disparos contra a aldeia. Os casos só foram diminuindo depois da intervenção do Ministério Público Federal e do Governo Federal nos anos 2010.

“Um dia, um dos meninos fazia a guarda na noite, escutou um tiro e correu atrás. Ele conseguiu alcançar o carro. Não lembro a data, mas era a polícia. Eles disseram que estavam perseguindo um motoqueiro, mas não tinha ninguém na frente. Pegamos as ‘cascas’ da bala, mas a polícia não queria pegar”, disse.

Não é tão fácil ser cacique. O prefeito ganha um dinheiro, mas não cuida do povo. Ser cacique é ter que cuidar do povo sem ter nada de dinheiro

Maria conta que a polícia disse para ficar com as cápsulas das munições deflagradas e que, assim como outros casos, não houve nenhuma investigação da tentativa de ameaça e intimidação.

A cacica Maria Aparecida afirma que, apesar de dividirem o espaço há mais de 80 anos, é forte o clima de animosidade entre os não índios e os Bororos de Jarudore. Disse que os indígenas não são desejados na região. Explica que a relação com os moradores do distrito se dá simplesmente por causa das crianças e adolescentes, que estudam nas escolas do povoamento, além daquelas com os estabelecimentos comerciais para aquisição de comida e outros itens para os indígenas.

“Nós fazemos a nossa parte. Eles ficam na dele e, enquanto eles ficam na deles, está bom. não tem provocação. Antes, tinha muito; agora deram uma acalmada”, disse.

Processo de desintrusão - Ao entrar com a ação, em 2007, o Ministério Público Federal apontou que, violentados nos seus direitos, "maltratados, famintos e doentes”, os Bororo foram forçados a desocupar a área. O MPF pediu, na ação, a retirada imediata de pessoas não indígenas.

Em 28 de junho de 2019, o juiz federal Victor de Carvalho Saboya Albuquerque, da 1ª Vara de Rondonópolis, concedeu liminar para a desintrusão da terra pertencente aos índios Bororo.

A Procuradoria Regional do Estado entrou com recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Na época, o desembargador Nunes Marques (hoje ministro no Supremo Tribunal Federal) acolheu o pedido e suspendeu o processo de desintrusão. A decisão saiu depois de visitas da bancada federal do Congresso ao presidente Jair Bolsonaro (PL). Desde então, o processo de desintrusão se encontra parado, e os Bororos sem o território de volta.

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