LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
O desembargador Orlando Perri afirmou que é o seu colega Luiz Ferreira da Silva quem deverá julgar a ação de suspeição contra dois dos quatro coronéis que atuam como juízes militares no processo que investiga o esquema de “grampos” no Estado.
A suspeição contra os coronéis Valdemir Benedito Barbosa e Luiz Cláudio Monteiro da Silva foi requerida pela defesa do cabo Gérson Correa Júnior e distribuída ao magistrado no dia 8.
O requerimento é baseado em “excesso de linguagem” e “antecipação da condenação”. O caso foi remetido a Perri por prevenção (preferência), pois o magistrado chegou a conduzir as investigações das escutas clandestinas no ano passado, antes de o caso “subir” ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Porém, o desembargador afirmou que sua prevenção foi cessada a partir do momento em que o ministro Mauro Campbell, do STJ, determinou que os supostos crimes militares dos grampos fossem remetidos à 1ª Instância.
“Percebe-se, às escâncaras, que a Ação Penal Originária n. 87.031/2017, que, supostamente, implicaria na prevenção deste Desembargador para atuar como Relator da presente exceção de suspeição, transformou-se justamente na Ação Penal n. 17000-11.2017.811.0042 [código 477158], que tramita perante a Décima Primeira Vara Criminal Especializada da Justiça Militar da Capital, haja vista que as autoridades, à época denunciadas pelo Ministério Público Estadual, não mais ostentam foro por prerrogativa de função. Por esta razão, não há falar, em absoluto, em prevenção deste Relator, por dependência aos autos da Ação Penal Originária n. 87.031/2017, conforme o fez o Departamento Auxiliar Judiciário”.
De acordo com Perri, após a ação “descer” para a 11ª Vara Militar, a defesa do cabo Gérson Correa entrou com um habeas corpus pedindo sua soltura, medida que foi distribuída ao desembargador Luiz Ferreira da Silva.
Alair Ribeiro/MidiaNews
O desembargador Orlando Perri, que redistribuiu ação para colega
O habeas corpus em questão foi julgado pela 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, que determinou a soltura do militar na última quarta-feira (14), mediante medidas cautelares, “dentre elas o uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno e aos finais de semana, proibição de contato com os demais acusados e testemunhas, proibição de frequentar repartições públicas e comparecimento mensal em juízo”.
“À vista do exposto, determino a redistribuição da presente exceção de suspeição à Terceira Câmara Criminal, sob a relatoria do Des. Luiz Ferreira da Silva, na forma regimental”, decidiu Perri.
“Juízo depreciativo”
Na ação de suspeição, a defesa do cabo – feita pelos advogados Neyman Monteiro e Thiago Abreu – relatou que os dois coronéis mostraram parcialidade em audiência ocorrida no dia 9 de fevereiro, ocasião em que foi pedida a revogação da prisão de Gérson Correa.
Os advogados disseram que o coronel Valdemir Barbosa, ao votar por manter a prisão, afirmou que o cabo “tomava ou tomou decisões superiores ao coronel”.
No voto, o coronel também lançou suspeitas sobre qual seria a influência que Gérson Correa possui junto ao Governo do Estado.
“Ainda que não bastasse, o primeiro excepto induz suspeita de improbidade sobre o excipiente ao reverberar: ‘eu tenho a impressão, doutor, que em hipótese alguma o cabo pagava o aluguel desse escritório com o dinheiro dele’, acrescentando a indagação no sentido de que ‘R$ 1.500,00 por mês?’ e concluindo que ‘eu não acredito. O primeiro excepto registra suas impressões pessoais com alto grau de subjetivismo consignando que ‘eu acho que a participação dele é bem superior ao do coronel Zaqueu’”.
No que tange ao coronel Luiz Cláudio Monteiro da Silva, a defesa ressaltou que, na audiência, ele disse estar “patenteado no processo” que o cabo “extrapolou a esfera das atribuições”.
“Em seguida, profere juízo depreciativo em relação ao acusado denotando sua convicção pessoal antecipada do mérito ao vaticinar que ‘realmente causa estranheza as decisões adotadas pelo réu’, concluindo que ‘eu confesso que poucas vezes vi dessa forma’”.
"Limites extrapolados"
De acordo com a defesa, como o pedido era apenas sobre a necessidade ou não de manter a prisão preventiva, os juízes militares deveriam ter se restringindo a verificar se estavam presentes os requisitos da prisão, como garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal, periculosidade, segurança da aplicação da lei penal militar e exigência da manutenção das normas ou princípios de hierarquia e disciplina militares.
Alair Ribeiro/MidiaNews
O cabo Gérson Correa, que acusa coronéis de serem suspeitos para julgá-lo
“Ocorre que os exceptos não se ativeram aos pressupostos da manutenção da prisão cautelar, preferindo exarar juízo de valor (culpabilidade) sobre a controvérsia antes do momento propício (sentença de mérito)”.
“De fato, ao invés de procederem à cognição sumária dos fatos para justificar a manutenção do decreto prisional, os exceptos trataram o excipiente como autor certo de crimes já comprovados, em caráter de definitividade, inclusive atribuindo-lhe participação superior ao primeiro acusado (Coronel Zaqueu Barbosa)”.
Citando entendimentos do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT), as advogados argumentaram que a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) veda aos magistrados emitirem opiniões pessoais sobre os processos pendentes de julgamento.
“No caso concreto, não seria necessário cognição verticalizada ou produção de provas, bastando apenas salientar que se reconheça, data venia, o óbvio: os nobres juízes militares exceptos já emitiram juízo de valor sobre os crimes imputados ao ora excipiente e, portanto, macularam sua condição de imparcialidade”, diz trecho da ação.
O esquema
Também são réus do esquema o ex-comandante da Polícia Militar, coronel Zaqueu Barbosa; os coronéis Evandro Alexandre Lesco e Ronelson Barros, ex-chefe e ex-adjunto da Casa Militar, respectivamente e o coronel Januário Batista.
Os grampos clandestinos militares tinha a finalidade de espionagem política, escuta de advogados no exercício de sua função, jornalistas, desembargadores, deputados e médicos. E, nesse contexto, estima-se que foram grampeados ilegalmente entre 80 (oitenta) e 1000 (mil) terminais, não se sabendo ao certo.
Gérson foi o único a confessar o crime. O cabo afirmou que chegou a operar as escutas ilegais dentro do Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público Estadual (MPE), local onde atuava.
“Nesse período, eu estava lotado no Gaeco, fazia dupla jornada. Com o surgimento da plataforma Sentinela, facilitou muito o trabalho porque o acompanhamento era operado pela web. Então, eu realizava algumas escutas na sede do Gaeco mesmo”, afirmou.
Segundo Gérson Correa, foi o cabo PM Euclides Luiz Torezan, também envolvido na trama, quem instalou o sistema em seu computador no Gaeco, para que ele pudesse ouvir os grampos dentro da instituição.
Do Gaeco, Gérson passou a operar os grampos de uma sala comercial, localizada na Rua Desembargador Ferreira Mendes, nº 235, na região central de Cuiabá. Lá, ele teve ajuda de outros quatros militares.
As interceptações, segundo ele, só foram interrompidas após o promotor de Justiça Mauro Zaque – que descobriu o esquema - interrogar os coronéis Zaqueu Barbosa e Airton Siqueira sobre o caso.
Leia mais sobre o assunto:
TJ concede liberdade a cabo da PM acusado de operar grampos
Perri irá decidir se dois coronéis são suspeitos para julgar cabo
Quer receber notícias no seu celular? Participe do nosso grupo do WhatsApp clicando aqui .
Tem alguma denúncia para ser feita? Salve o número e entre em contato com o canal de denúncias do Midiajur pelo WhatsApp: (65) 993414107. A reportagem garante o sigilo da fonte.