LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
O advogado Roberto Tardelli, que faz a defesa do ex-secretário de Estado de Fazenda, Marcel de Cursi, disse que o Ministério Público Estadual (MPE) fez “manobras infantis” e foi até mesmo “machista” ao oferecer a denúncia derivada da Operação Sodoma 2.
No último dia 12, com as advogadas Aline Giacon, Lilian Conway e Marianna de Mendonça, Tardelli protocolou a defesa preliminar do ex-secretário, apontado como o “mentor intelectual” de suposto esquema que exigiria propina de empresários em troca da concessão de incentivos fiscais e contratos com o Estado.
Marcus Mesquita/MidiaNews
O ex-secretário Marcel de Cursi: réu da Sodoma e preso no Centro de Custódia
As supostas “manobras infantis” do MPE, segundo Tardelli, estariam no fato de a denúncia da Sodoma 2 acusar Marcel de Cursi – que está preso desde setembro de 2015 - dos mesmos fatos aos quais ele já responde na ação penal derivada da 1ª fase da operação.
“Na denúncia, mister é convir, nenhum fato novo, salvo aqueles já levianamente assacados contra Marcel de Cursi, é descrito; deveras, tudo o que se lhe assesta é que supostamente integraria organização criminosa, liderada por Silval Barbosa. Ao acusado cumpriria funções cerebrais, técnicas, filosóficas, chegando-se ao desatino de sedimentar a denúncia com acusações de estudo de leis. Caberia também a Marcel a elaboração de leis esdrúxulas, como se fosse ele o Legislativo Mato-grossense”, afirmou.
“Tem-se, na espécie, o que não se poderia imaginar, duas acusações, duas denúncias, em torno de um único fato: organização criminosa”, completou.
Tardelli disse que a denúncia, assinada pela promotora Ana Cristina Bardusco, não apontou, em momento algum, qual foi a colaboração de Marcel de Cursi nos fatos investigados, que investigam a compra de um terreno de R$ 13 milhões com dinheiro de propina.
Ele observou que nenhum dos delatores destes fatos, nos depoimentos, citou o ex-secretário como membro do esquema.
“Do que ele [Cursi] efetivamente se defenderá? Defender-se-á de pertencer a uma suposta organização criminosa, uma vez que não poderá defender-se do que sequer é mencionado, a aquisição fraudulenta de um bem imóvel na capital do Estado [...] Se não há uma única linha no sentido de afirmar como Marcel de Cursi teria colaborado para a aquisição do terreno, como promover sua defesa?”, questionou.
Se não há uma única linha no sentido de afirmar como Marcel de Cursi teria colaborado para a aquisição do terreno, como promover sua defesa?
Conforme o advogado, todas as provas contra Cursi são as mesmas que já foram descritas na ação da Sodoma 1, com base no depoimento do empresário João Batista Rosa, que contou ter sido obrigado a pagar propina para que suas empresas recebessem incentivos fiscais.
“Não há nova acusação, mas a mesma e velha imputação, à qual se agregaram fatos absolutamente inócuos (a conta de sua esposa, pertencente à pessoa jurídica da qual é titular), além de juízos morais invectivados, ser ele estudioso (material nesse sentido encontrado em seu computador pessoal apreendido), sem que se mencionasse que ser estudioso seria o primeiro dos atributos a se esperar de quem ocupasse a Secretaria Estadual de Fazenda”, afirmou.
“A mediocridade da imputação é tanta, que se chega ao extremo de socorrer-se a denúncia de uma matéria isolada, publicada em mídia eletrônica local, como se fosse expressão de uma verdade ali retratada vazara de um órgão público sensível e que trazia apenas a verdade publicada, que nunca se há de confundir com a verdade pública do processo legalmente instaurado. O que não passou de uma notícia veiculada na imprensa foi encartada na denúncia com o valor probante de um laudo pericial!”, disse.
“Informações difamatórias”
O advogado Roberto Tardelli também fez apontamentos sobre os trechos da denúncia que lançam suspeitas sobre a empresa de Marnie de Almeida Cláudio, mulher de Marcel de Cursi, cuja sede é localizada no endereço da sogra do ex-secretário.
A denúncia diz que, possivelmente, a empresa teria atuado como “fachada” para movimentar milhões de reais obtidos de forma criminosa e que o CNPJ dela foi aberto dois dias após Cursi assumir a Secretaria de Estado de Fazenda.
Segundo o advogado, a lei que trata das microempresas possibilita que as mesmas sejam instaladas no local de residência, o que seria “praxe no mercado”.
Tardelli também disse que a promotora de Justiça demonstrou “desconhecimento palmar das regras da vida” ao afirmar que a referida empresa foi aberta em dois dias.
O advogado chegou a recomendar que Ana Bardusco falasse com um dono de padaria para se informar melhor.
“Se a DD Promotora de Justiça indagasse ao dono da padaria que lhe vende o pão que estala em suas mãos todas as manhãs, ele lhe diria que levou meses para conseguir um CNPJ e, caso quisesse saber quanto demoraria para cancelar esse CNPJ, talvez ele lhe dissesse que poderia levar uma vida inteira...”, exemplificou.
Se a DD Promotora de Justiça indagasse ao dono da padaria que lhe vende o pão que estala em suas mãos todas as manhãs, ele lhe diria que levou meses para conseguir um CNPJ
O advogado afirmou que, mesmo citada na denúncia, Marnie de Almeida não foi denunciada, uma vez que não teria cometido crime algum.
“Foi apenas difamada, posta no centro das atenções da mídia por divulgações anti-éticas (sic) e impedida de manifestar-se, de trazer ao juízo a verdade dos fatos, haja visto que optou deliberadamente o MP por não ouví-la em Juízo, sob o crivo do contraditório. Beira o inacreditável”, relatou.
De acordo com Tardelli, a denúncia chegou a adotar inspiração machista ao se referir à mulher de Marcel de Cursi.
“Referir-se a ela, como foi feito, não passou de veleidade irresponsável, que o Direito não pode acolher, visto que a denúncia não é uma peça de fofocas, de mexericos, vindo a se transformar em um palanque de difamações grosseiras e gratuitas, lançando-se aos ventos, em inspiração paradoxalmente machista, que uma mulher não poderia ser remunerada em função de seu talento, de sua expertise profissional, nada mais que um juízo de valor diminutivo e preconceituoso e, pois, inaceitável”, alegou.
Um palanque de difamações grosseiras e gratuitas, lançando-se aos ventos, em inspiração paradoxalmente machista, que uma mulher não poderia ser remunerada em função de seu talento
A denúncia da Sodoma
Segundo a denúncia, o grupo era dividido em várias ramificações, e cada uma das ramificações possuía graus hierárquicos.
Silval Barbosa é apontado como o líder da organização, "responsável por articular e coordenar as ações dos demais integrantes".
O grupo atuaria exigindo pagamento de propina para conceder incentivos fiscais e para manter contratos de empresas com o Governo do Estado.
Na divisão secundária figuram os ex-secretários de Estado Pedro Nadaf, Marcel de Cursi, Cezar Zílio e Pedro Elias; o ex-secretário adjunto de Administração, coronel José Jesus Nunes Cordeiro; o ex-chefe de gabinete de Silval, Sílvio Cézar Correa Araújo; o ex-procurador do Estado Chico Lima; a ex-secretária de Nadaf na Fecomércio, Karla Cintra; e o filho de Silval, o médico e empresário Rodrigo Barbosa.
“Os indícios apontam que a organização criminosa atuou de forma perene durante toda a gestão de Silval Barbosa, provocando prejuízo a toda a população mato-grossense, que até hoje arca com as consequências das ações criminosas de seus membros, frente ao sucateamento da máquina administrativa, ausência de investimento em infraestrutura, na saúde, segurança e educação pública, etc”, diz trecho da denúncia.
Já o ex-deputado José Riva foi denunciado após o depoimento do empresário Paulo Mischur, da empresa Consignum, alvo da 2ª fase da Sodoma.
Mischur relatou que pagou R$ 17,6 milhões ao grupo liderado por Silval e a José Riva para manter o contrato que tinha com o Estado.
O ajuste da propina, conforme a ação, teria sido feito com a ajuda do empresário Tiago Dorileo, que também é alvo da Operação Ararath.
O grupo também teria exigido R$ 1 milhão da Zetra Soft, do empresário Fábio Drumond, para que a empresa passasse a gerenciar os empréstimos consignados dos servidores – tarefa então feita pela Consignum.
A tratativa, no entanto, acabou não sendo efetivada e o contrato – assim como as supostas propinas pagas para mantê-lo – continuou com a empresa de Mischur.
Também foi denunciado o servidor Bruno Sampaio Saldanha, que atualmente está no Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT).
Ele teria exigido propina para fazer “vistas grossas” ao contrato do empresário Julio Tisuji, da empresa Webtech, que também confessou ter pago valores ao grupo.
Quanto ao prefeito cassado de Várzea Grande, Walace Guimarães, consta na denúncia que ele ofereceu R$ 1 milhão, em 2012, ao então secretário de Administração, César Zílio, para que o poder público pagasse valores a gráficas – por serviços inexistentes ou incompletos - no intuito de levantar dinheiro para pagar custos de campanha.
Entre as gráficas estavam as de propriedade dos empresários Antonio Roni de Luz e Evandro Gustavo Pontes da Silva, igualmente denunciados.
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