LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
O desembargador Alberto Ferreira, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT), criticou a demora na decisão do julgamento do Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado contra o juiz Marcos José Martins de Siqueira, da comarca de Várzea Grande.
Marcos Siqueira é acusado de ter presidido a audiência com a “presença” de Olympio José Alves, morto em 2005, e liberado a quantia de R$ 8 milhões por meio de um alvará judicial. Nascido em 1918, Alves faleceu em um hospital de São Paulo, vítima de pneumonia. Na audiência judicial, um farsante se fez passar por ele.
O julgamento tem sido levado ao plenário do TJ-MT desde o final de fevereiro, mas adiado várias vezes, seja pela falta de quórum ou por constantes pedidos de vistas dos desembargadores.
Ao proferir seu voto, na sessão desta quinta-feira (21), o desembargador Alberto Ferreira se mostrou perplexo pelo fato de o magistrado investigado ainda não ter sido afastado das funções em
"Mentimos ao juramento que fizemos ao tomar posse neste tribunal. Estamos diante do Direito Penal ‘ao inimigo tudo, ao amigo nada’"
“Se fosse o ‘zé da silva’ já teria sido afastado, julgado e na prisão. O caso é de gravidade extrema, mas é um fato simples e todos os votos proferidos até agora foram de natureza solar. O afastamento pode se dar a qualquer momento, inclusive por decisão monocrática do presidente do tribunal”, ressaltou.
Para o desembargador, a forma como o julgamento tem se “arrastado” acaba por arranhar a imagem da instituição.
“Não é cabível uma situação dessas. Praticamente todos os dias a mídia tem falado sobre esse caso. Não podemos deixar a sociedade zombar do tribunal”, criticou.
Alberto Ferreira ainda alertou os colegas sobre o corporativismo no TJ-MT e relembrou, sem citar nomes, os escândalos que abalaram o tribunal há alguns anos, como a Operação Asafe e o “Escândalo da Maçonaria”.
“Mentimos ao juramento que fizemos ao tomar posse neste tribunal. Estamos diante do Direito Penal ‘ao inimigo tudo, ao amigo nada’. Este tribunal já esteve em situação bastante ruim, melhorou, mas me parece que está havendo um certo retrocesso. Nós estamos a brincar com coisa séria”, apontou.
O julgamento do PAD contra o juiz foi adiado devido ao pedido de vistas do desembargador Pedro Sakamoto.
O Pleno decidiu então por enviar os autos, na íntegra, a todos os desembargadores para evitar que a questão seja novamente adiada. Além disso, ficou marcada para a próxima quinta-feira (28) o julgamento do pedido de afastamento cautelar contra o juiz.
Dos 27 desembargadores que compôem o Pleno, 21 já votaram pela aposentadoria compulsória de Marcos José, punição administrativa máxima que um juiz pode receber.
No caso de Marcos José, são necessários 18 votos para que ele seja aposentado compulsoriamente, de acordo com o artigo 27 da Lei Orgânica da Magistratura (Loman), que estabelece o mínimo de dois terços dos votos para a punição. No entanto, os desembargadores ainda podem mudar seus respectivos votos.
Entenda o caso
Segundo consta nos autos, o falecido, Olympio José Alves, teria participado da audiência em companhia de seu advogado e reconhecido uma dívida, no valor de R$ 8 milhões.
Logo em seguida o juiz determinou a liberação do alvará para pagamento do valor.
A questão é que Olympio morreu em um hospital de São Paulo em 2005, vítima de pneumonia, cinco anos antes da audiência. Na audiência judicial, um farsante se fez passar por ele.
A dívida reconhecida pelo “falecido” teve como beneficiária a empresa Rio Pardo Agro Florestal. Na ocasião, dois advogados da empresa participaram da audiência, sendo eles André Luiz Guerra e Alexandre Perez do Pinho, de acordo com o que consta dos autos.
Para o desembargador Sebastião Barbosa, que é relator do caso, as informações trazidas na sindicância demonstrariam que as falhas “do magistrado contribuíram de forma direta para que o ato fraudulento pudesse ser realizado”.
“Houve mais de uma falha crucial, não houve a devida cautela no sentido de averiguar a assinatura e nem a idoneidade das partes presentes. Caso houvesse esse cuidado, restaria demonstrado, de maneira cabal, que a pessoa que estava na audiência não seria o falecido”, disse o desembargador.
Outro desembargador que se manifestou sobre o caso foi Luiz Carlos da Costa. Para ele, o juiz não soube distinguir um "gambá de uma onça pintada".
“Toda a defesa caiu por terra. Ele sabia desde o início que se estava a praticar crimes graves. O que foi constatado nos autos não se coadunam com a postura de um magistrado”, ressaltou.
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