LAICE SOUZA
DA REDAÇÃO
Na entrevista especial da semana, o presidente da Associação dos Magistrados Mato-grossense (Amam), juiz Agamenon Alcântara Moreno Júnior, destaca a importância da campanha encabeçada por Mato Grosso e pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) em prol das eleições diretas para presidente de Tribunal de Justiça. “Um juiz passa a vida toda dele preparando eleições que garantam a toda a população o direito sagrado de eleger seus representantes e ele mesmo não pode eleger”, destaca.
A campanha será lançada em Cuiabá no próximo dia 22, e a proposta já está tramitando na Câmara Federal. O projeto é uma iniciativa da Amam com a AMB e da frente parlamentar do estado. O autor é o deputado Wellington Fagundes (PR).
Ainda de acordo com Agamenon, “o que se tenta hoje e o que se postula é que a gente possa eleger o nosso presidente, buscando assim uma oxigenação na administração dos tribunais, com todos os órgãos do Poder Judiciário”.
O presidente da Amam conversou também sobre a busca por transparência no Poder Judiciário e a nova fase da magistratura. “A associação não vai passar a mão na cabeça de ninguém”, refere aos casos que envolverem magistrados em que for comprovada a prática de atos ilegais e vedados da profissão.
Agamenon também abordou assuntos como os rumos do Judiciário, a importância da transparência dos atos e o relacionamento com outros poderes como o Legislativo. “Porque não basta você ser honesto, mas tem que demonstrar essa honestidade. O risco de interpretações equivocadas é lógico que tem, mas a exteriorização das atitudes tanto dos poderes como associativos é que vão demonstrar esse grau de independência que é buscado e é a essência da magistratura. Porque o juiz dependente não serve para ninguém”, ressaltou.
Confira a entrevista completa abaixo.
MidiaJur – Como irá funcionar o projeto de eleições diretas nos tribunais caso seja aprovado no Congresso Nacional?
Agamenon Alcântara – Essa proposta não é uma proposta nova, a Associação Nacional há muito tempo vem lutando no sentido da necessidade de democratizar o Poder Judiciário. A democratização passa necessariamente por eleições, aos cargos eletivos. No ano passado foi feita a proposta junto as associações nacionais e encaminhada a frente parlamentar, para o deputado federal Wellington Fagundes. Foi ele quem apresentou essa PEC que visa, primeiro que os elegíveis sejam todos os desembargadores, e não mais os três mais antigos, tanto para presidente como para vice- presidente. Para o cargo de corregedor, o tribunal é quem deverá continuar a elegendo seu corregedor. Além dessa questão dos elegíveis, a PEC estabelece que passe a ser possível não só aos membros do Tribunal, mas que todos os juízes vitalícios possam votar e escolher o presidente. Um juiz passa a vida toda dele preparando eleições que garantam a toda a população o direito sagrado de eleger seus representantes e ele mesmo não pode eleger, diferentemente do Ministério Público e da Defensoria Pública. O que se tenta hoje e o que se postula é que a gente possa eleger o nosso presidente, buscando assim uma oxigenação na administração dos tribunais, com todos os órgãos do Poder Judiciário.
MidiaJur – Então essa seria a vantagem dessa proposta?
Agamenon Alcântara – Exatamente, porque quem for o candidato terá que informar sua proposta. E isso naturalmente acarretará uma abertura maior e consequentemente, não tenho dúvida, trará uma melhora também na prestação jurisdicional. Porque terá possibilidade de ouvir os anseios dos juízes do interior, das diferentes localidades, das diferentes diversidades dessa situação e permitirá que alguns anseios possam ser atingidos. Ou seja, quando um juiz pleiteia condições melhores e quando ele afirma que as condições, em termos de aparelhamento e de servidores, não possibilitam a ele dar uma resposta que a sociedade merece, a partir do instante que eu democratizo o Poder Judiciário, eu possibilito que essas medidas possam ser mais discutidas.
MidiaJur – O lançamento nacional dessa campanha pelas eleições diretas será aqui em Cuiabá, no próximo dia 22, isso se deve ao trabalho realizado pela frente parlamentar que foi idealizada aqui no Estado?
Agamenon Alcântara – O ano passado quando foi idealizada a frente parlamentar mista, surgiu de uma visita do Calandra [presidente da Associação dos Magistrados do Brasil] em Cuiabá. Nessa oportunidade foi feita uma visita ao Tribunal na presença dos senadores Pedro Taques e Jayme Campos e o deputado federal Wellington Fagundes. E surgiu a ideia de se criar uma frente parlamentar para melhorar o sistema judicial. Essa idéia surgiu daqui, nasceu, depois foi germinada numa reunião que teve em Brasília, capitaneada pela AMAM e AMB, onde foram todos os parlamentares do estado e presidentes de associações regionais e ali começou e foi se formatando a necessidade que se tinha no Congresso Nacional de se ter um ambiente que pudéssemos discutir melhorias que visassem dar melhores condições aos magistrados e, consequentemente, que pudessem fazer e dar vazão as cobranças que se têm hoje. Mas 80% das cobranças que são decorrem de fatores externos, como ausência de servidores e juízes. Então, a escolha de Mato Grosso decorre das ações desenvolvidas e surgidas aqui com a AMB e associação.
MidiaJur – Agora essa aproximação dos membros do Poder Judiciário com o Poder Legislativo pode deixar margem para interpretações equivocadas? O senhor teme que isso possa ser interpretado como forma de em um futuro ter que ser concedidos favores?
Agamenon Alcântara – A questão de interpretação depende de quem está interpretando. O que tem que ser claro e tranquilo e que quando você fala em relação entre poderes ela tem que existir. A própria Constituição diz que somos poderes harmônicos e independentes. Eu acho que hoje, cada vez mais a sociedade está atenta para evitar eventuais abusos ou interferência de um poder no outro. É terrível e maléfico para toda a sociedade. Estou na frente da associação há um ano e seis meses e não tem como você administrar, se você não tiver um relacionamento. (...) O problema pode existir na exteriorização da coisa, porque não basta você ser honesto, mas tem que demonstrar essa honestidade. O risco de interpretações equivocadas é lógico que tem, mas a exteriorização das atitudes tanto dos poderes como associativos é que vão demonstrar esse grau de independência que é buscado e é a essência da magistratura. Porque o juiz dependente não serve para ninguém.
MidiaJur – O senhor, enquanto presidente da associação dos magistrados do estado, como visualiza a situação da magistratura estadual e como acredita que a sociedade enxerga a categoria em decorrência dos últimos acontecimentos como a aposentadoria de 10 magistrados?
Agamenon Alcântara – Não sei ao certo qual foi o momento que isso aconteceu, mas a população está analisando a magistratura com mais calma e detalhamento as atitudes dos agentes políticos de maneira geral. Então teve um momento em que se surgiu um monte de denúncias contra o Poder Executivo, depois contra o Legislativo e agora a gente percebe nos últimos anos, não só em Mato Gross, mas em todo o país, um olhar mais atento ao Poder Judiciário. O juiz não tem medo disso. E eu costumo dizer que a magistratura de uma maneira geral abraça o Conselho Nacional de Justiça, porque é um meio de se questionar alguns atos praticados no Judiciário que o magistrado também não concorda. Então nós estamos em um momento de busca por transparência, de busca por um relacionamento interno e externo. Hoje o juiz tem que estar atento que é necessário a interação com a sociedade. Tudo isso é para dizer o seguinte, eu não tenho dúvida que corremos o risco de perguntar para alguém o que ele acha do Judiciário e essa pessoa não ter tido nenhum processo tramitando e dizer que é moroso. Há um senso comum em algumas situações e o próprio magistrado reconhece que há erro e que precisa ser melhorado. Às vezes o magistrado tem sete ou oito mil processos e ele também é cobrado e não tem infraestrutura. Um colega me falou a seguinte frase: se cobra do magistrado uma atitude de uma empresa de primeiro mundo, com maquinários de terceiro mundo. Por isso, é importante a transparência. Porque um juiz pode mostrar o que ele produz e poderá ser verificado que é a estrutura que não está condizente. Agora na visão da associação é que a Justiça nos últimos anos evoluiu muito. Tempos um presidente que tem dado respaldo e a prova é o término do concurso e a pose dos novos juízes. É nítida a aproximação do Poder Judiciário com a magistratura e com o público externo.
MidiaJur – Então o senhor acredita que o Poder Judiciário Estadual está no caminho certo?
Agamenon Alcântara - Eu acho que sim. É um caminho difícil, não é um caminho fácil, porque a ansiedade de quem postula e muito grande. Mas, estamos caminhando em um bom sentido.
MidiaJur – Novamente volta a questão das aposentadorias compulsórias de magistrados em Mato Grosso, como a associação se posiciona a esse respeito?
Agamenon Alcântara – O que foi decidido no Supremo não foi o mérito, foi só um agravo regimental, que é um recurso cabível contra uma decisão liminar e esse agravo analisou só um aspecto dentre os pedidos que foram feitos. O processo ainda não terminou. Eu falo isso e deixo claro que em termo de associação, o que ela busca e o que ela gostaria é que essa situação incomoda não só para os dez, mas para toda a magistratura do estado resolva o quanto antes. A associação não entra no mérito desse processo, o que defendemos é que o seu tramite não pode demorar tanto assim. Estamos chegando há dois anos e em que qualquer coisa que acontece no estado, envolvendo o Poder Judiciário vai ter sempre uma mensagem lembrando o que aconteceu em 2010. Isso não é admitido e chega a ser uma covardia com a magistratura do Estado de Mato Grosso. (...) Estamos entrando em uma fase de transparência, saímos de uma ausência total e estamos nesse meio termo, em que as coisas estão se ajustando no bom sentido.
MidiaJur – E como se portar caso surjam denúncias envolvendo magistrados?
Agamenon Alcântara – Aqui é importante dar a devida dimensão em que está denunciando e com base em que está denunciando. Porque é muito “comum”, o magistrado ser vendido em algumas situações absurdas, que se quer ele sabia ou tenha participado. Só para citar como exemplo, quando estava como juiz em Poxoréu, eu tinha dado uma decisão, e nem me lembro direito qual era o caso concreto, e o prefeito era candidato a reeleição.(...) Aí a decisão era contra o interesse do prefeito. Eu estava no banco e o pessoal comentou comigo que tinha uma pessoa na fila que falou que agora sim ele viu que o “doutor era bom mesmo. Porque ele vivia almoçando na casa do prefeito”. Eu nunca tinha almoçado na casa do prefeito [risos] e isso é natural acontecer. Agora quando se verificar que o fato é concreto e comprovado, a associação não vai passar a mão na cabeça de quem está atingindo não só diretamente a sociedade, mas todos nós magistrados. É importante também investigar as denúncias também para responsabilizar quem fizer por má fé.
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