LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
Documentos apreendidos durante a Operação Sodoma mostraram que o ex-secretário de Estado de Fazenda (Sefaz), Marcel de Cursi, não só rastreou o acesso de delegados e promotores de Justiça ao sistema da Sefaz, como tentou impedir que eles obtivessem dados que tramitavam na secretaria.
A informação está contida em relatório da Polícia Civil que analisou pen-drives e computadores utilizados por Marcel de Cursi, preso desde setembro de 2015 no Centro de Custódia da Capital.
O ex-secretário é acusado de ser um dos “mentores” do suposto esquema de corrupção e lavagem de dinheiro, que teria lucrado R$ 2,6 milhões, entre 2013 e 2014, por meio de cobrança de propina para a concessão de incentivos fiscais pelo Prodeic (Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso).
Além dele, também foram presos pelos fatos o ex-secretário de Estado de Indústria, Comércio, Minas e Energia, Pedro Nadaf, e o ex-governador Silval Barbosa (PMDB).
Cursi também teve um segundo mandado de prisão decretado contra si, neste mês, durante a Operação Sodoma II. A operação apontou que parte da propina teria sido destinada ao ex-secretário de Administração, Cézar Zílio, para colaborar com a compra de um terreno de R$ 13 milhões.
Pedido de rastreamento
Conforme a investigação, Marcel de Cursi pediu a um funcionário do setor de Tecnologia da Informação da Sefaz, em email enviado em 28 de novembro de 2014, a elaboração de um relatório com os registros completos dos acessos de diversos usuários ao sistema da secretaria.
Tal relatório deveria ser gravado em CD ou pen drive e repassado a Valeria Cristina Cunha Cintra, então funcionária da secretaria.
Os 22 usuários alvos do relatório eram delegados da Polícia Civil, a exemplo de Lindomar Toffoli e Liliane Costa; promotores de Justiça como Roberto Turin e Marco Aurélio Castro; e servidores da Sefaz, Polícia e do Ministério Público Estadual (MPE).
O documento com as planilhas de acesso também foi apreendido no pen drive do ex-secretário.
As planilhas elencam as datas em que os usuários acessaram o sistema e quais foram os dados visualizados.
“Além destes arquivos, foi possível identificar outros relacionados a este assunto (Log), sendo que estes foram alocados em um diretório e disponibilizado em mídia digital (Outros arquivos). Estes documentos possuem em seu corpo listas de acessos e permissoes dos usuários citados anteriormente", informou o relatório policial.
Outro documento apreendido foi um procedimento de resposta da Secretaria de Estado de Fazenda à Secretaria Extraordinária de Ações do Gabinete do Governador sobre suposto acesso indevido de dados fiscais sigilosos.
Na resposta, datada de dezembro de 2014, o então secretário Marcel de Cursi afirmou que membros do MPE estariam acessando tais dados, o que, segundo ele, excederia o acesso autorizado por lei.
Para a Polícia, no entanto, há suspeitas sobre o real interesse das secretarias em querer impedir o acesso a estes dados.
“O objetivo [do procedimento] seria retirar o acesso dos usuários a determinadas ferramentas de fiscalização e pesquisa. Outro ponto relevante seria o fato de servidores possuírem o acesso ao “Log de Acessos” dos usuários que utilizam o sistema, visto que isso poderia acarretar em prejuízos aos objetivos das instituições, principalmente na exposição de dados pessoais dos utilizadores”.
“A insegurança gerada se dá por não conseguir determinar se o pedido do Sr. Marcel de Cursi foi um caso isolado ou se seria uma prática corriqueira de gestores das instituições, no entanto, demonstra que Marcel Souza de Cursi estava acompanhando as empresas que estavam sendo acompanhadas pelos servidores do Ministério Público Estadual e Polícia Civil”, diz a conclusão do relatório policial.
Esclarecimento de servidor
O servidor Marcos Daniel Martins de Souza, que foi o destinatário do pedido de Cursi para rastrear os acessos, enviou nota ao site esclarecendo o procedimento.
Confira a nota na íntegra:
"Considerando a reportagem postada (http://www.midianews.
"Mentor intelectual"
Na decisão que decretou a prisão dos políticos, a juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, afirmou que Marcel de Cursi era um dos “mentores intelectuais” do alegado esquema.
A magistrada apontou que Cursi usou de seus conhecimentos para obrigar o empresário João Batista Rosa do grupo Tractor Parts, a procurar a organização e conseguir “enredá-lo na teia criminosa”. Rosa foi delator do esquema, mas teve a delação anulada após a magistrada enquadrá-lo como vítima, e não como coautor dos fatos.
De acordo com a decisão, mesmo após o término do mandato do governador Silval Barbosa, Cursi e Nadaf continuaram a exigir dinheiro do empresário, que, além de pagamentos mensais, abrira mão de um crédito fiscal de R$ 2,55 milhões em favor do "grupo criminoso".
Para a juíza Selma Arruda, a conduta de Marcel de Cursi durante a reunião com João Batista - assim como as mensagens que o mesmo mandou ao empresário por “WhatsApp” - teve o intuito de “intimidar o colaborador, de deixá-lo com medo, bem como de evitar que o mesmo acabasse falando a verdade, ou seja, delatando a fraude”.
“Além disso, a mensagem via Whatsapp na qual Marcel envia a João Batista um link sobre uma reportagem que se refere ao esquema como um caso de polícia, denota claramente sua intenção de impor medo ao colaborador, referentemente ao que poderia acontecer, caso as irregularidades fossem reveladas”, afirmou.
A alegada intimidação foi um dos fatores que levou a magistrada a decretar a prisão de Marcel de Cursi, uma vez que há indícios de que ele poderia coagir testemunhas caso ficasse em liberdade.
“Daí, a necessidade da decretação da custódia preventiva como único meio capaz de tutelar a livre produção de provas e impedir que os agentes criminosos destruam ou manipulem provas e ameacem testemunhas, ou seja, de que comprometam a instrução criminal e a busca da verdade real”, avaliou.
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