LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
O juiz Jeferson Schneider, da 5ª Vara Federal de Mato Grosso, afirmou que um bilhete escrito à mão pelo ex-secretário de Estado de Fazenda, Eder Moraes, é uma “prova incontestável” de que ele cometeu os crimes de desvio, lavagem de dinheiro e corrupção passiva em 2008.
Eder foi condenado a 24 anos e oito meses de prisão pelo magistrado, em sentença assinada na última quinta-feira (15), relacionada a uma das ações penais derivadas da Operação Ararath.
O bilhete citado pelo magistrado continha nomes de empresas e valores para as quais o empresário José Geraldo de Saboia Campos, que é delator do esquema, deveria depositar como parte da propina de R$ 2,5 milhões paga a Eder em troca da liberação de R$ 11,2 milhões, devidos pelo Estado, à Saboia Campos Construções e Comércio Ltda.
O ex-secretário tentou ligar o bilhete a um pedido de informação feito pelo ex-secretário de Infraestrutura, Vilceu Marchetti, assassinado em 2014. A tese de defesa foi rejeitada pelo magistrado.
De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), a construtora de José Saboia tinha precatórios a receber do Estado, e tentava obter os créditos por meio de ações judiciais que tramitavam na 2ª Vara da Fazenda Pública da Capital.
O então secretário de Fazenda, Eder Moraes, propôs que o empresário desistisse das ações em troca de firmar um acordo administrativo para o pagamento dos precatórios.
O juiz Jeferson Schneider, que condenou Eder Moraes
O MPF narrou que o acordo previa que o empresário devolvesse, a título de propina, parte dos R$ 11,2 milhões, por meio de depósitos nas contas de empresas indicadas por Eder.
Após José Saboia entregar o protocolo provando que desistiu das ações, no dia 3 de dezembro de 2008, Eder entregou a ele um papel escrito a mão com os nomes e valores a serem depositados.
“Isto é, às empresas G.A. Capilé de Oliveira e S.M.L. Comunicação os valores de R$ 400 mil e R$ 180 mil respectivamente, ademais dos R$ 2 milhões transferidos para a empresa Globo Fomento Ltda [empresa de Júnior Mendonça, também delator da Ararath]”.
Em seu interrogatório, Eder Moraes confirmou que escreveu o bilhete, mas disse que redigiu a pedido do então secretário de Infraestrutura, Vilceu Marchetti, que teria passado em seu gabinete horas antes da reunião com José Saboia.
Na mesma data, o ex-secretário autorizou o pagamento de R$ 11,2 milhões em favor da construtora, mesmo com parecer contrário da Procuradoria Geral do Estado (PGE) - e com discordância de valores por parte da Auditoria Geral do Estado (AGE).
“História fantasiosa”
Para o juiz Jeferson Schneider, há provas suficientes de que Eder Moraes exigiu propina do empresário José Saboia Campos em troca da liberação dos pagamentos.
“A narrativa dos fatos apresentada pelo colaborador encontra perfeita sintonia com as demais provas do processo, o que permite concluir que o acusado Eder de Moraes Dias efetivamente solicitou vantagem indevida”.
O magistrado citou que a prova “inconteste” do acordo ilícito firmado entre Eder e José Saboia Campos foi um bilhete escrito a mão pelo primeiro e entregue ao segundo.
“Por ocasião da celebração do acordo de colaboração premiada, o colaborador entregou esse bilhete no qual consta o nome das empresas beneficiárias e os respectivos valores a serem pagos, isto é, G. A. Capilé de Oliveira (R$ 400.000,00) e S. M. L. Comunicação (R$ 180.000,00)”, disse o juiz.
O acusado Eder de Moraes Dias efetivamente solicitou vantagem indevida
“O acusado Eder de Moraes Dias afirmou não saber do que se tratavam as informações por ele anotadas no bilhete, o qual fora efetivamente repassado pelo acusado ao colaborador quando este esteve em seu gabinete cobrando o pagamento de seus créditos”.
A versão apresentada por Eder, porém, foi totalmente descartada pelo magistrado.
“[Eder] tentou justificar a existência do bilhete com uma história fantasiosa, sem qualquer amparo nas demais provas dos autos [...] Portanto, tenho que o bilhete manuscrito pelo acusado Eder de Moraes Dias materializa a solicitação de vantagem indevida realizada pelo acusado ao colaborador”.
Schneider destacou que Eder, ao liberar o pagamento de R$ 11,2 milhões, chegou a juntar os pareceres da PGE e da AGE em sua autorização, mesmo que ambos os documentos tenham sido contrários à liberação dos recursos.
“O descuido e a certeza da impunidade era tal, que no despacho de autorização de pagamento se faz referência ao Parecer nº 022/GPG/2008 da Procuradoria-Geral do Estado e ao Parecer Técnico nº 003/2008, da Auditoria- Geral do Estado, que sequer estão juntados no processo administrativo [...] Dessa forma, não há a menor dúvida de que o acusado Eder de Moraes Dias, enquanto Secretário de Fazenda do Estado de Mato Grosso, autorizou o pagamento da empresa Saboia Campos Construções e Comércio Ltda sem qualquer amparo legal, pois, ademais de o pagamento ser contrário à manifestação judicial da Procuradoria-Geral do Estado, também não seguiu as normas para pagamento administrativo”.
[Eder] tentou justificar a existência do bilhete com uma história fantasiosa, sem qualquer amparo nas demais provas dos autos
De igual maneira, o juiz concluiu que as provas e depoimentos juntados no processo provam que Eder cometeu o crime de peculato.
“Tenho que perfeitamente comprovado nos autos que o acusado Eder de Moraes Dias, no exercício e em razão do cargo de Secretário de Estado de Fazenda, apropriou-se de recursos públicos, mediante desvio, em proveito próprio e alheio, do valor de R$11.228.950,52,quando autorizou e geriu o pagamento da empresa Saboia Campos Construções e Comércio Ltda (segunda parte do caput do art. 312 do Código Penal)”.
No que tange à lavagem de dinheiro, Schneider também entendeu que os R$ 2 milhões repassados pela Lince Construtora (outra empresa de José Saboia) à Globo Fomento, assim como os R$ 580 mil transferidos para as empresas G. A. Capilé de Oliveira e S. M. L. Comunicação não passaram de uma tentativa de Eder para “lavar” a propina obtida.
“O simples fato de a vantagem indevida ter sido solicitada e recebida pelo acusado Eder de Moraes Dias por meio de interposta pessoa, especialmente, sem qualquer vínculo jurídico ou familiar com o autor do crime antecedente, configura, por si só, o crime de lavagem de dinheiro, pois evidenciada a intenção de ocultação e dissimulação quanto à natureza e origem do valor”, decidiu o juiz.
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