LUCAS RODRIGUES E THAIZA ASSUNÇÃO
DA REDAÇÃO
O ex-presidente da Companhia Mato-grossense de Mineração (Metamat), João Justino Paes de Barros, reafirmou que utilizava um avião fretado da empresa aérea “Abelha” para ir até Peixoto de Azevedo (672 km ao Norte de Cuiabá) comprar barras de ouro para os ex-secretários de Estado Pedro Nadaf e Marcel De Cursi.
João Justino é um dos delatores da Operação Sodoma 4, deflagrada em setembro de 2016. Ele prestou depoimento na tarde desta terça-feira (04), à juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, titular da ação penal.
O dinheiro utilizado na compra foi obtido por meio da propina recebida em um esquema de desapropriação da área conhecida como Jardim Liberdade, em Cuiabá, no governo do ex-governador Silval Barbosa (PMDB), que teria lucrado R$ 15,8 milhões.
Cursi está preso desde setembro de 2015 no Centro de Custódia de Cuiabá. Já Nadaf conseguiu liberdade com uso de tornozeleira eletrônica na mesma época da deflagração da 4ª fase da operação, após confessar seus crimes.
Confira como foi a audiência:
Denúncia verdadeira (atualizada às 14h29)
Questionado sobre a veracidade da denúncia do Ministériop Público Estadual (MPE), João Justino confirmou os fatos.
Quem me entregou o dinheiro para comprar o ouro foi o Nadaf, mas eu entreguei dessa vez na mão do Marcel
"A denúncia é verdadeira. No caso especifico desse terreno, eu tenho muito pouco a dizer porque não sei quase nada, só sei pela mídia. Só sei da compra do ouro. Eu era presidente da Metamat e ia quase sempre para o interior. Então uma vez conversando com o Nadaf falei a respeito do minério. Ele disse que ia ver coisa e tal, e numa oportunidade ele disse que tinha interesse em comprar".
"O Pedro sempre dizia que representava um grupo de empresários. Depois uma vez ele disse que o Marcel de Cursi também estava interessado. No total acredito que foram 10 kg de ouro que comprei para eles. Mas eu não sabia que o dinheiro que eles me davam era ilicito".
O ex-presidente da Metamat disse que ganhou R$ 20 mil pela encomenda, valor que devolveu aos cofres públicos no acordo de delação.
"Eu ia de avião, ligava para os garimpeiros, encomendava e ia buscar, depois voltava. Era muito fácil comprar o ouro lá, pegava direto do garimpo, aquela época, entre 2014 e 2015, a região de Peixoto de Azevedo estava famosa por causa do ouro".
Ouro na mochila (atualizada às 14h37)
João Justino relatou que na última vez que foi comprar ouro aos ex-secretários, na volta da viagem Marcel de Cursi já estava o esperando no hangar da Cia Aérea Abelha.
"Eu entreguei o ouro numa mochila para ele lá. Era cerca de 4 a 5 kg, salvo engano. Mas quem me entregou o dinheiro para comprar o ouro foi o Nadaf, mas eu entreguei dessa vez na mão do Marcel".
A promotora de Justiça Ana Cristina Bardusco questionou como Marcel sabia o horário para pegar o ouro no hangar.
"Eu liguei para ele avisando que ia chegar tal horario e ele foi lá e pegou".
Entrega na Casa Civil (atualizada às 14h45)
Em relação ao ouro encomendado por Nadaf, João Justino contou que fazia as entregas na própria Casa Civil.
"Quando a quantia era maior entregava na garagem da Casa Civil, mas quando era menor, na sala mesmo dele [Nadaf]".
"Eu não me lembro porque exatamente o Marcel foi buscar esse ouro no aeroporto. Não sei se o Nadaf estava viajando, não lembro, mas deve ser por conta da quantidade também do ouro. Essa foi a última compra que fiz e a maior, esses 4, 5 kg de ouro hoje dá em torno de R$ 700 mil. Deve ser por isso que ele quis buscar pessoalmente".
João Justino disse que não sabe da participação do ex-chefe de gabinete de Silval, Silvio Correa, do ex-secretário de Planejamento, Arnaldo Alves, do procurador aposentado Chico Lima, do ex-presidente do Intermat, Afonso Dalberto, do advogado Levi Machado e dos empresários Alan Malouf e Valdir Piran em esquemas dentro do Governo.
"Eu tinha uma relação próxima somente com o Nadaf. Ele sempre dizia que tinha muita dívidas de campanha para ser paga, que tinha pessoal cobrando, inclusive de uma dívida com esse Valdir Piran, mas eu não o conheço, só sei o que o Pedro [Nadaf] me disse".
"Eu sei que o que fiz foi errado, não poderia como presidente da Metamat comprar ouro de forma ilícita. Aliás, não podeira sendo ou não sendo presidente".
Sodoma 4
Segundo as investigações, o empresário e delator Filinto Muller foi procurado pelo então procurador do Estado Francisco Andrade Lima Filho, o “Chico Lima”, que teria lhe pedido para criar uma empresa, em nome de laranja, a fim de possibilitar a lavagem de dinheiro da organização.
Esta empresa, segundo a Polícia, recebeu várias transferências bancárias da Santorini Empreendimentos, por meio do advogado Levi Machado de Oliveira, no intuito de “lavar” a propina.
A Polícia ressaltou que a Santorini tinha autorização para expropriar a área desde 1997, mas só em 2011, por meio do sócio Antônio Rodrigues de Carvalho, pediu que o Estado adquirisse a área pelo valor de R$ 37,1 milhões.
Porém, apenas no final de 2013, o então chefe de gabinete do ex-governador Silval Barbosa, Sílvio Araújo, encaminhou o pedido a Chico Lima para que este elaborasse um parecer.
Segundo a Polícia, apenas 55 hectares (no valor de R$ 17,8 milhões) estavam aptos a serem desapropriados, mas o grupo aumentou para 97,5 hectares, “a fim de obter lucro”.
O delator e sócio da Santorini, Antônio Rodrigues de Carvalho, contou que, em janeiro de 2014, foi a uma reunião agendada com Chico Lima e o então secretário de Estado de Fazenda, Marcel de Cursi, na sede da Sefaz. Nesta reunião, segundo ele, Cursi exigiu que 50% do valor pago pela desapropriação retornasse para o grupo.
Dias depois, de acordo com a representação, o à época chefe da Casa Civil, Pedro Nadaf, editou o decreto que autorizou a desapropriação da área, subscrito por Silval Barbosa.
Para legalizar o futuro pagamento da indenização, o então presidente do Intermat, Afonso Dalberto, solicitou que a Sefaz agilizasse recursos para garantir o repasse.
Entretanto, como na época o Intermat não possuía o recurso para fazer o pagamento, o secretário de Planejamento Arnaldo Alves teria ajustado dotação orçamentária suficiente para atender a demanda da indenização.
O próximo passo da organização, conforme a Polícia, foi a abertura de decretos orçamentários que viabilizaram créditos suplementares para a regularização fundiária.
Assim, entre maio e outubro de 2014, foram publicados sete decretos que possibilitaram que os R$ 31,7 milhões fossem pagos pela área. Pedro Nadaf detalhou como foi feita a lavagem de dinheiro do esquema, durante depoimento em que confessou os crimes, trazendo cheques da empresa SF Assessoria emitidos a pessoas próximas.
No esquema, Afonso Dalberto disse que se beneficiou de R$ 606,4 mil. Já o delator Filinto Muller relatou que Chico Lima ajustou com ele que os R$ 15,8 milhões do “retorno” seriam lavados por meio da empresa dele, a SF Assessoria.
As investigações também apontaram que o advogado Levi Machado de Oliveira recebeu uma “comissão” de 3% do montante (R$ 474 mil) para colaborar nas tratativas.
Ainda segundo a Polícia, era Chico Lima o responsável por definir quais membros receberiam as propinas oriundas dos desvios. Além dele próprio, também seriam beneficiários: Silval Barbosa, Pedro Nadaf, Marcel de Cursi, Arnaldo Alves e Afonso Dalberto.
Segundo a denúncia, a propina recebida por Nadaf e Arnaldo, por outro lado, teria sido lavada com a ajuda do empresário Alan Malouf, sócio do Buffet Leila Malouf.
Já a parcela de Silval Barbosa, no valor de R$ 10 milhões, teria sido integralmente repassada ao empresário de factoring Valdir Piran, a título de pagamento de dívidas de campanha.
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