LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
A Igreja Mundial do Poder de Deus foi condenada a indenizar em R$ 50 mil, por danos morais, um pastor que teria sido agredido física e verbalmente dentro da instituição religiosa pelo fato de, no passado, ter tido experiências homossexuais.
A decisão, datada da última segunda-feira (6), é da juíza Helena Maria Bezerra Ramos, da 8ª Vara Cível de Cuiabá.
Segundo a ação movida pelo pastor R.A.F., que se autodeclara “ex-gay”, as agressões ocorreram na noite de 6 de dezembro de 2009, ocasião em que ele dormia nas dependências da igreja, na Capital.
Na época, ele atuava como pastor auxiliar da igreja comandada pelo "apóstolo" Valdomiro Santiago.
R. contou que, naquela noite, foi acordado “a socos e pontapés” por um pastor identificado como “Jademir”, por motivos de discriminação sexual.
Depois de ter sido espancado, ele disse que procurou o bispo Sidney Furlan, que o aconselhou a não registrar queixa-crime “para salvaguardar o nome da instituição religiosa”.
R.A.F. relatou que o pastor que o teria agredido apareceu no programa de TV da Igreja Mundial, dizendo frases como: “ (...)estamos sendo perseguidos... Até o Ibama veio atrás de nós porque bateram em um veado”.
“Argumenta que esperava que o seu bispo, no uso de suas atribuições, fosse impor ao seu agressor ao menos sanção administrativa, contudo, tornou-se também seu algoz, ao permitir que tais comentários fossem feitos no programa de televisão do qual é responsável e ainda, pelos corredores da igreja”, diz trecho da ação.
Além disso, o pastor R.A.F afirmou que foi, posteriormente, excluído do rol de ministros da Igreja Mundial do Poder de Deus.
Na ação, ele requereu indenização de R$ 1 milhão pelos danos morais sofridos.
Igreja contesta
Já a Igreja Mundial do Poder de Deus argumentou que as acusações de R.A.F, dando conta que o pastor Jademir é um “marginal, agressor e preconceituoso”, não seriam verdadeiras.
“O requerente [R.A.F] sempre esteve em posição de destaque junto à congregação religiosa e se existissem tais preconceitos e violência por parte do Corpo da Igreja, o requerente não teria alçado à função de Pastor, comandando um grupo de jovens”, alegou a igreja.
A instituição religiosa ainda disse que a culpa da expulsão foi do próprio R.A.F, “que se encarregou de propalar como um ‘injustiçado agredido e vítima de preconceito sexual’ a toda sociedade”.
Contradições
Em sua decisão, a juíza Helena Ramos afirmou que a defesa da Igreja Mundial apresentou contradições quanto aos fatos narrados.
A requerida preferiu colocar ‘panos quentes’, impedindo o requerente de efetuar a queixa e depois, quando os ânimos estivessem menos exaltados, efetuar o desligamento do requerente sem qualquer direito de defesa
Isso porque, em depoimento, o bispo Sidney Furlan negou ter expulsado o pastor R.A.F e contou que ele teria abandonado a igreja, confirmando o desentendimento de R. com o pastor Jademir.
Porém, ao apresentar a defesa formal, a instituição negou a existência dos desentendimentos e agressões e disse que desligou R.A.F. da igreja após ele levar o caso ao conhecimento da mídia.
“Embora as agressões não tenham sido presenciadas por nenhuma pessoa, entendo que as afirmações trazidas na inicial, em conjunto com o boletim de ocorrência são coerentes e críveis, sendo corroboradas pela série de contradições coletadas no depoimento do preposto da requerida”, disse a juíza.
Para a magistrada, as provas demonstram que a Igreja Mundial do Poder de Deus, por meio de seus representantes, proferiu ofensas contra o pastor R.A.F., “utilizando a sua opção sexual para atacá-lo”, além de denegrir “sua honra e imagem perante terceiros”.
“Sublinhe-se que, o fato de a requerida afirmar que teria efetuado o desligamento do requerente em razão de suas denúncias demonstra a veracidade das afirmações do requerente, já que em nenhum momento buscou apurar os fatos, tentando por vias transversas calar a voz da vítima, pois, quando foi procurado na madrugada pelo requerente deveria tê-lo levado para efetuar boletim de ocorrência e efetuar exame de corpo de delito, até mesmo para se eximir de qualquer responsabilidade”, afirmou.
Helena Ramos disse que, ao contrário das declarações da igreja, o depoimento de R. “se mostrou claro e coerente”.
“Pelo que se extrai dos autos, a requerida preferiu colocar ‘panos quentes’, impedindo o requerente de efetuar a queixa e depois, quando os ânimos estivessem menos exaltados, efetuar o desligamento do requerente sem qualquer direito de defesa”, disse
A juíza então arbitrou indenização no valor de R$ 50 mil à igreja, como forma de reparar os danos morais cometidos contra o pastor.
“É perfeitamente passível de ressarcimento o dano moral causado no caso em exame, tendo em vista que o requerente foi ultrajado, humilhado e discriminado, resultando na violação ao dever de respeitar aquela gama de direitos inerentes a personalidade de cada ser humano, especialmente a dignidade pessoal”, decidiu.
A decisão ainda é passível de recurso.
Outro lado
A redação entrou em contato com o número de telefone atribuído à sede de Cuiabá da Igreja Mundial do Poder de Deus, mas a operadora afirmou que o número não existe.
O advogado Edison Pereira Prado, que consta como defensor da igreja no processo, não foi localizado.
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