LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
A advogada Janaina Polla Reinheimer, filha do empresário Roque Reinheimer - réu confesso do esquema investigado na Operação Bereré -, atua como coordenadora técnica da CPI dos Fundos que tramita na Assembleia Legislativa.
A CPI dos Fundos apura se o dinheiro do Fundo da Educação Básica (Fundeb) e do Fundo de Transporte e Habitação (Fethab) está sendo utilizado para pagar outros débitos do Poder Executivo.
Janaina e o pai são investigados na Bereré, operação que visa desarticular esquema de fraude, desvio e lavagem de dinheiro no âmbito do Detran-MT, na ordem de R$ 27,7 milhões, que operou de 2009 a 2015.
Segundo as investigações, parte dos valores repassados pelas financeiras à EIG Mercados (antiga FDL) por conta do contrato com o Detran retornava como propina a políticos, dinheiro esse que era “lavado” pela Santos Treinamento – parceira da EIG no contrato - e por servidores da Assembleia, parentes e amigos dos investigados.
Roque Reinheimer, que é sócio da Santos Treinamento, confessou ter integrado o esquema em depoimento ao Ministério Público Estadual (MPE).
O MPE também convocou Janaina a depor, em razão de ela ter feito e recebido diversas transferências não só do pai, mas de outros investigados na operação, como a própria EIG e o também sócio da Santos Treinamento, Antonio da Costa e Silva.
Apenas em transações com o pai, a advogada teria movimentado mais de R$ 450 mil em sua conta.
Em momento algum desconfiei que esse dinheiro repassado por Roque Anildo a título de pensão era proveniente de atividades ilícitas
Ela chegou a ser alvo de pedido de prisão temporária (que foi negado), sob a suspeita de ter cometido “uma sequência de atos destinados a esconder a origem ilícita do dinheiro” oriundo da EIG Mercados. Mas a Justiça negou o pedido.
“Empréstimos”
Em seu depoimento, a advogada justificou que as transferências feitas a seu pai foram relativas à compra de uma Mitsubishi ASX, adquirida por meio de dinheiro emprestado por Roque.
“Meu pai, após vender o veículo placas [...], no início do ano de 2014, me emprestou a quantia de R$ 50 mil, sendo que posteriormente esse valor emprestado foi quitado na íntegra, conforme comprovantes que junto nessa oportunidade”.
Janaina Reinheimer também alegou que parte do montante recebido se trata de pagamento de móveis planejados para seu escritório de advocacia, “cujos valores foram pagos diretamente por Roque Anildo ao prestador de serviços, sendo ressarcidos depois por mim, conforme contrato de prestação de serviços que junto nesta oportunidade”.
“Me recordo que paguei algumas multas e impostos para meu pai Roque Anildo, no valor aproximado de R$ 4,5 mil, cujos comprovantes junto neste ato, sendo que posteriormente fui ressarcida desses valores pelo meu pai”.
No que tange aos demais valores, a advogada afirmou que são frutos da pensão de R$ 13 mil por mês que seu pai paga desde 2008 para ela, sua irmã Juliana e sua mãe Gladis Reinheimer.
“Esse valor deveria subsidiar o pagamento de despesa do lar, bem como o pagamento das mensalidades do curso de Medicina da Juliana, do curso de Enfermagem da minha mãe Gladis e do meu curso de Direito. Esses valores eram depositados ora na conta da minha irmã Juliana, ora na conta de minha mãe Gladis. Os pagamentos não eram realizados em datas fixas, e nem pagos em sua totalidade, às vezes eram pagos em transferências, cheques ou dinheiro”.
Janaina disse que nunca buscou saber qual era a procedência dos valores que seu pai repassava para a família.
“Sei dizer que todos os pagamentos das despesas de casa que podiam ser realizados através da internet, eram realizados por minha irmã Juliana, utilizando tanto a conta pessoal da mesma, quanto de minha mãe Gladis [...] Em momento algum desconfiei que esse dinheiro repassado por Roque Anildo a título de pensão era proveniente de atividades ilícitas”, disse.
Quanto aos R$ 4 mil recebidos do advogado Antonio Costa, Janaina afirmou que o valor tem origem na prestação de seus serviços prestados por ela em uma ação judicial que tramitou no Tribunal de Contas da União.
Além da CPI dos Fundos, a advogada contou que já atuou na CPI da Copa do Mundo de 2014, por indicação do deputado Oscar Bezerra (PSB), e na CPI dos Frigoríficos, a convite do deputado José Domingos Fraga (PSD).
Ela também relatou que chegou a trabalhar para a EIG Mercados, mas que após o executivo José Kobori ter se tornado presidente da empresa, foi demitida mesmo estando grávida de oito meses de gestão.
Veja trecho do depoimento:
A operação
A operação Bereré foi desencadeada em fevereiro com o cumprimento de mandados de busca e apreensão na Assembleia Legislativa, em imóveis e escritórios, além da sede da empresa em Brasília.
Foram alvos da operação o presidente da Assembleia Legislativa, Eduardo Botelho (PSB), o deputado estadual Mauro Savi (PSB), o ex-deputado federal Pedro Henry, servidores públicos, empresas e particulares.
A operação é desdobramento da delação premiada do ex-presidente do Detran, Teodoro Moreira Lopes, o "Dóia". Ele revelou esquemas de corrupção na autarquia, iniciados em 2009, e que renderia, ao menos, R$ 1 milhão por mês.
Também contribuíram para a investigação os depoimentos do ex-governador Silval Barbosa e de seu irmão Antonio Barbosa, delatores da Operação Malebolge, que confessaram ter participado do esquema no Detran.
As empresas FDL Serviços de Registro, Cadastro, Informatização e Certificação Ltda (que agora usa o nome de EIG Mercados Ltda.) e a Santos Treinamento Ltda teriam sido usadas para lavar dinheiro no esquema.
A EIG Mercados venceu uma licitação, em 2009, para prestar serviços de registro de financiamentos de contratos de veículos, por um período de vinte anos.
Até julho de 2015, a empresa ficava com 90% da arrecadação anual - estimada em R$ 25 milhões - e o órgão com 10%. Em julho de 2015, já na gestão Pedro Taques (PSDB), o Detran fez um termo aditivo ao contrato, passando a receber 50% da arrecadação.
Conforme as investigações, parte dos valores milionários pagos pelo Detran à FDL eram repassados para a empresa Santos Treinamento, que seria de fachada e atuaria apenas para “lavar” e distribuir a propina aos políticos. Dezenas de servidores e parentes de servidores do Poder Legislativo também teriam sido usados para lavar o dinheiro arrecadado por meio do esquema criminoso.
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