VEJA SP
Cerca de 150 000 advogados atuam na cidade de São Paulo. Entre eles, os que recebem maior atenção da mídia são os criminalistas, aqueles que lidam com homicídios, corrupção, tráfico de drogas e tudo o mais que aparece nas páginas policiais. Mas, no quesito presença sob os holofotes, hoje em dia ninguém rivaliza com o paulistano Antônio Claudio Mariz de Oliveira. Nos últimos anos, ele tem sido fotografado, filmado e entrevistado com freqüência cada vez maior. Tudo por causa dos casos rumorosos em que é chamado para atuar. Entre seus clientes, destacam-se a proprietária da Daslu, Eliana Tranchesi, acusada de formação de quadrilha e falsidade ideológica; o filho de Pelé, Edinho, acusado de envolvimento com tráfico de drogas; Antonio Marcos Pimenta Neves, ex-diretor de redação de O Estado de S.Paulo, que confessou ter assassinado a namorada a tiros; o ex-prefeito Celso Pitta, que enfrentou um processo de impeachment; e Suzane von Richthofen, a estudante que mandou matar os pais.
Ele é atualmente a estrela mais reluzente em uma constelação que já contou com o fluminense Heleno Fragoso (1926-1985), o piauiense Evandro Lins e Silva (1912-2002) e os paulistas Waldir Troncoso Peres, hoje afastado dos tribunais, e Márcio Thomaz Bastos, que não advoga desde que se tornou ministro da Justiça. Aos 60 anos de idade e 37 de carreira, Mariz conquistou a fama de que livra qualquer um da cadeia. Um exagero, pois é claro que ele não vence todas as batalhas. Seu retrospecto, no entanto, é de tirar o chapéu. Todos os clientes citados no parágrafo anterior, por exemplo, estavam em liberdade na semana passada. Um dos primeiros casos a fortalecer a reputação de Mariz foi a defesa de PC Farias, no início dos anos 90. Acusado de receber dinheiro para fazer tráfico de influência, o ex-tesoureiro de Fernando Collor recorreu ao advogado. Na época, comentava-se que Mariz cobraria 2 milhões de dólares de honorários por um trabalho que provavelmente se arrastaria por anos. PC teve sua prisão decretada. "Eu disse para ele ficar tranqüilo e se apresentar, pois conseguiria soltá-lo em vinte dias", lembra o advogado. Como PC fugiu (seria preso na Tailândia meses depois), Mariz desistiu de atendê-lo e embolsou apenas parte da bolada.
Contar com Mariz ao lado do banco dos réus é caro. Apenas o pedido de habeas corpus para livrar o cliente da cadeia sai entre 50.000 e 100.000 reais, que ele recebe mesmo se não obtiver sucesso. Acompanhar um processo inteiro não costuma custar menos de 80.000 reais. Esses valores variam de acordo com a complexidade de cada caso e da capacidade financeira de quem o contrata – segundo o criminalista, 20% das pessoas que atende não pagam nada. Além dele, trabalham em seu escritório, no 4º andar de um vistoso prédio na Avenida Paulista, mais oito advogados. Cuidam atualmente de 700 ações. "São 700 casos de inocentes", brinca.
Formado pela PUC em 1969, Mariz escolheu o direito criminal por acaso. Mesmo antes de sair da faculdade, ele trabalhava no escritório cível de seu pai, o desembargador Waldemar Mariz de Oliveira Júnior, morto em 2001. Foi convidado por José Carlos Dias, outra fera dos tribunais que viria a ser ministro da Justiça no governo FHC, para ajudá-lo em um processo de homicídio. Pegou gosto e passou a atuar como defensor dativo (aquele que é designado pela Justiça para atender gratuitamente réus sem recursos). "Na advocacia criminal conhecemos as misérias e as grandezas humanas", afirma Mariz. "A adrenalina é sem igual."
Mariz foi secretário de Justiça e de Segurança Pública no governo Quércia, presidiu a OAB em São Paulo e ocupa atualmente a presidência do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. É filiado ao Partido Socialista Brasileiro (PSB) desde 1997, por influência da ex-prefeita e deputada federal Luiza Erundina, de quem é amigo. "Ele está sempre me indicando livros e discos de música popular brasileira", diz Erundina. A música é uma das paixões do criminalista. Quando se aposentar, ele pretende escrever sobre a história do Brasil por meio de canções. Para isso, estuda, ouve sambas das primeiras décadas do século XX e anota suas impressões. Com 1,76 metro, 100 quilos, fala pausada e hábitos simples, parece um bonachão. Mas se transforma quando veste uma beca e entra em um tribunal. "Ele faz parte de uma linhagem de grandes oradores, característica muito importante para quem atua no júri", comenta a promotora Luiza Nagib Eluf.
Ao defender réus como Suzane von Richthofen, Pimenta Neves ou PC Farias, Mariz irrita muita gente que parece ignorar o princípio jurídico elementar de que qualquer acusado, seja lá qual for o crime cometido, tem direito à mais ampla defesa – direito, aliás, do qual não pode abrir mão. "Já chegaram a escrever para um jornal dizendo que esse tipo de advogado devia ir para a cadeia junto com os clientes", diz ele, que não se incomoda com patrulhamentos. Nunca rejeita um caso por causa da natureza do crime cometido. Recorda-se apenas de uma ocasião em que se negou a defender um cliente por isso. Foi no início da década de 70, quando trabalhava para o Centro Social da Polícia Militar de São Paulo e encontrou um PM acusado de atentado violento ao pudor contra uma menina de 4 anos. "Minha primeira filha era pequena e aquilo me embrulhou o estômago", conta. "Todo mundo tem direito à defesa, mas o advogado deve sempre consultar o estômago."
Nascido na Vila Mariana, quando garoto jogava bola nas proximidades da Rua Estela. Era um lateral direito perna-de-pau, como ele mesmo se define. Manteve o gosto pelo futebol. São-paulino doente, Mariz é conselheiro vitalício do clube e assiste aos jogos nas cadeiras cativas do Estádio do Morumbi. Em 1992 candidatou-se a presidente, mas perdeu a eleição. Para comemorar o título de tricampeão mundial, conquistado no fim do ano passado, personalizou o toque de seu celular com o hino do tricolor. Mora com a mulher, a também advogada Ângela Mariz de Oliveira, que conheceu na faculdade, em uma casa no bairro de Cidade Jardim. Os dois têm quatro filhos: a advogada Renata, a jornalista Juliana, a nutricionista Fernanda e o estudante de direito Fábio. Mas Mariz derrete-se mesmo é pela neta de 6 anos, Maria Fernanda, filha de Renata. Por ela, joga-se na piscina e brinca de caçadas noturnas no jardim de sua residência. "Ele até rola no chão, coisa que eu nunca tinha visto", conta Juliana. Quando não leva serviço para além do expediente, passa os fins de semana na Praia de Pernambuco, no Guarujá, ou no Alto do Capivari, em Campos do Jordão, onde tem casas. Uma vez por ano, faz uma viagem internacional. Em outubro último, passou quinze dias na região de Bordeaux, na França.
É vaidoso (no fim do ano passado, resolveu tirar o bigode porque "estava ficando branco demais"), centralizador (garante que todos os casos de seu escritório passam por suas mãos) e briguento. Entre seus amigos, tornou-se comum a expressão "marizada". Quando o grupo está conversando sobre determinado assunto e um dos presentes se exalta, os outros brincam que deu uma marizada. "Ele tem pavio curto, briga, grita... mas cinco minutos depois está tudo bem", afirma o colega Carlos Miguel Aidar, ex-presidente da seccional paulista da OAB e ex-presidente do São Paulo Futebol Clube. "Depois, diz que só discute com quem gosta."
O esporte preferido de Mariz é encontrar os amigos em bares e restaurantes. Almoça quase sempre na região da Paulista, no Spot, no Moraes ou no Maksoud Plaza. Entre os bares, seus prediletos são o Pandoro, o Léo, o Juarez, A Juriti e o Original. Adora receber e organiza festas de aniversário consideradas memoráveis. Dias antes, não consegue conter a ansiedade. Pede à secretária que ligue para os convidados e confirme a presença de cada um. Morre de medo de que não vá ninguém. Mas a casa fica invariavelmente cheia. E às vezes aparece até algum cliente.
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