DA REDAÇÃO
O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, por meio da 20ª Promotoria de Justiça Cível de Cuiabá, alertou para indícios de fraudes, simulações negociais e irregularidades contábeis no pedido de recuperação judicial apresentado pelo Grupo Safras. Em parecer assinado pelo promotor Marcelo Caetano Vacchiano, o órgão requer verificação técnica aprofundada antes que o processo possa ser deferido, apontando riscos de que o instituto da recuperação judicial esteja sendo usado de forma indevida para blindagem patrimonial e manipulação de credores.
Uma das frentes mais graves do parecer diz respeito ao controle oculto do Grupo Safras. Segundo o Ministério Público, existe um contrato de opção de compra de participação societária firmado entre os sócios formais e os fundos Axioma, Alcateia e Flow Invest, por meio do qual o controle real do grupo teria sido transferido a terceiros, especialmente ao empresário Luís Henrique Wolf, dirigente da Flow Invest.
De acordo com os documentos obtidos, esse contrato previa a aquisição de 60% do capital social do Grupo Safras por apenas R$ 100 mil, além da concessão de procurações irrevogáveis e irretratáveis outorgadas pelos sócios ao representante da Flow, conferindo-lhe amplos poderes de gestão e representação perante órgãos públicos, registros e instituições financeiras.
“As decisões empresariais relevantes, nos meses que antecederam o pedido de recuperação judicial, foram adotadas por terceiros investidores, o que pode comprometer a autonomia jurídica do grupo e a boa-fé do pedido”, afirma o Ministério Público.
Além do controle societário, o parecer se debruça sobre a operação do Bravano FIDC, fundo de investimento que aparece como credor extraconcursal da Safras Armazéns Gerais Ltda., com valor declarado superior a R$ 284 milhões. O MP aponta que esse fundo, originalmente registrado com o nome Safras Armazéns Gerais FIDC, pode ser um instrumento simulado de controle e movimentação financeira do próprio grupo.
Segundo a investigação, a carteira do fundo seria composta exclusivamente por créditos originados no Grupo Safras. No entanto, os créditos cedidos seriam recomprados antecipadamente pela própria Safras, gerando uma rentabilidade artificial e contábil, desvinculada do risco real da operação.
“Os relatórios da Austin Rating apontam que a rentabilidade do fundo não depende da adimplência dos sacados, mas da recompra dos títulos pela própria cedente. Essa estrutura anula o risco da operação e simula ganhos fictícios”, detalha o parecer.
A gestora do fundo, a Artesanal Investimentos Ltda., é a mesma que figura como contratada nos instrumentos de opção de controle com os fundos Axioma e Alcateia. Além disso, a Flow Gestora de Créditos, vinculada à Flow Invest, atua como “consultora especializada” do Bravano FIDC, com influência direta sobre a escolha dos títulos adquiridos. Essa sobreposição de papéis — sócio controlador, credor, gestor e consultor — pode configurar simulação negocial e conflito de interesses, segundo o MP.
O parecer também aponta que empresas com menos de dois anos de existência, sem receita ou com projeções de fluxo de caixa zeradas até 2029 foram incluídas indevidamente no polo ativo da recuperação judicial, em possível tentativa de diluir passivos ou reforçar artificialmente o grupo econômico.
Apesar da gravidade das informações, o Ministério Público entende que, neste momento processual, ainda não é possível decidir sobre o mérito do pedido, e defende a realização de uma constatação prévia técnica e isenta, já em andamento, para que sejam apuradas todas as evidências de fraude, irregularidade ou inconsistência contábil.
“O deferimento do processamento deve observar rigorosamente os pressupostos legais, preservando o interesse público e a regularidade do instituto da recuperação judicial”, conclui o promotor.
A manifestação do MP reforça o caráter complexo e sensível do caso, que envolve possíveis práticas fraudulentas, controle societário indireto por fundos de investimento e distorções contábeis com potencial impacto sobre o mercado e os credores. A decisão sobre o processamento do pedido segue pendente na 4ª Vara Cível da Comarca de Sinop.
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