CAMILA RIBEIRO E AIRTON MARQUES
DA REDAÇÃO
A juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, afirmou que o pacote de medidas de combate à corrupção, da forma como foi aprovado na Câmara dos Deputados, é um “ato típico da ditadura” e que poderá enfraquecer a autonomia de juízes e membros do Ministério Público.
No dia 30 de novembro, a Câmara “desfigurou” o projeto apresentado pelo Ministério Público Federal (MPF), que teve apoio de mais de 2,5 milhões de pessoas. O texto aprovado tem várias alterações da mensagem original, inclusive com um dispositivo que prevê punição de magistrados e promotores de Justiça por crime de responsabilidade.
“É muito provável que se esse projeto passar pelo Senado da forma que está, nós vamos começar a usar tornozeleira bem antes dos corruptos. Provavelmente os juízes serão fichas-sujas antes dos corruptos”, disse a juíza.
É muito provável que se esse projeto passar pelo Senado da forma que está, nós vamos começar a usar tornozeleira bem antes dos corruptos. Provavelmente os juízes serão fichas-sujas antes dos corruptos
“Se você ver alguns dispositivos que estão inseridos nessa lei, eles são tão absurdos... Como o de incriminar um juiz se ele esquecer de dizer ao réu que ele tem direito a permanecer em silêncio. Se ele esquece de dizer isso, estará cometendo um crime”, disse.Segundo a magistrada, o dispositivo aprovado pelos deputados criminaliza uma série de atitudes regulares de juízes e membros do Ministério Público, o que, na visão da juíza, é uma forma de os parlamentares “amordaçar” os integrantes das duas classes.
“O projeto criminaliza toda e qualquer atitude. Por exemplo, eu não poderia estar dando essa entrevista, pois eu poderia ser presa em flagrante em seguida. Quer dizer, isso é amordaçar o Judiciário, amordaçar o MP e é algo muito perigoso. Isso é um ato típico de ditaduras, é com isso que a gente não pode conviver”.
Selma Arruda também disse que apoia a posição defendida pelo juiz Sérgio Moro, no sentido de inserir uma cláusula ao projeto aprovado na Câmara.
“Óbvio que não se esperava que as medidas fossem aprovadas integralmente. É natural que o Legislativo trabalhe em cima do projeto e que ocorram algumas modificações, até porque não se tem unanimidade em tudo. Mas o que aconteceu é que das 10 medidas, sobraram quatro e essas quatro ‘mancas’, ‘desfiguradas’”, afirmou.
“O juiz Sergio Moro [reponsável pela Operação Lava Jato] deu uma saída muito inteligente para essa polêmica. Ele sugeriu que o projeto não seja abortado, mas que seja inserido nele uma cláusula expressa no sentido de dizer que o juiz ou o MP não podem ser punidos pelo seu entendimento jurídico”, defendeu a magistrada.
Após a aprovação na Câmara, o texto foi enviado ao Senado. O presidente da Casa, senador Renan Calheiros (PMDB/AL) pôs em votação um requerimento de urgência urgentíssima, mas os colegas rejeitaram. Assim, a proposta seguirá os trâmites normais.
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