LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
O Pleno do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) arquivou uma sindicância instaurada para apurar suposto desvio de conduta funcional praticado, em tese, pelo juiz Cássio Leite de Barros Neto, da comarca de Nova Mutum (239 km de Cuiabá).
A decisão foi dada na tarde desta quinta-feira (18), por 10 votos pelo arquivamento contra 7 pela abertura de procedimento administrativo disciplinar. O juiz era suspeito de ter manipulado sua produtividade para conseguir se classificar em concurso de promoção para comarcas de Segunda Entrância, na época em que atuava em Juara e Tabaporã.
Segundo a investigação, na época do concurso o juiz ingressou com uma impugnação em que questionava a demarcação do período de avaliação de sua produtividade. Ele requereu que fosse retirado o mês de setembro de 2012 da avaliação e que fosse incluído o mês de novembro de 2014, pedido que foi atendido na ocasião.
Porém, conforme a sindicância, os dados da produtividade relativa a novembro de 2014 estavam com uma “absurda distorção”. Isso porque em setembro de 2012, o relatório informava que o juiz havia trabalhado 21 dias, comandado 17 audiências e dado 30 decisões interlocutórias, 74 de mérito, 12 sem mérito e um acordo.
Já em novembro de 2014, com apenas cinco dias trabalhados (pois havia entrado de férias), o sistema havia registrado que Cássio Neto realizou 73 audiências, 1753 decisões interlocutórias, 317 sentenças de mérito e 93 sentenças sem mérito.
Na apuração, foi constatado que muitas das decisões lançadas como interlocutórias na verdade se tratavam de meros despachos, como de intimação de testemunhas. Arquivamento vence A relatora da sindicância e corregedora geral de Justiça, desembargadora Maria Erotides Kneip Baranjak, afirmou que a explicação do juiz e a oitiva das testemunhas comprovaram que não houve má-fé do magistrado.
Segundo se apurou com as assessoras e gestoras, o magistrado não teria pessoalmente determinado nenhum ato para permitir essa inserção
“Segundo se apurou com as assessoras e gestoras, o magistrado não teria pessoalmente determinado nenhum ato para permitir essa inserção. Elas próprias realizaram o lançamento e não tiveram nenhuma orientação do magistrado para agir dessa forma. Ele não teve responsabilidade direta nisso”, disse Erotides.
A corregedora também destacou que o equívoco não beneficiou Cássio Neto no concurso de promoção e que, assim que foi informado do erro, ele fez as correções no sistema. “Não houve dolo, houve um despreparo”, disse ela, ao votar pelo arquivamento da sindicância.
O entendimento foi acompanhado pelo desembargador Carlos Alberto Barros da Rocha. Ele ressaltou que era perfeitamente possível a ocorrência do erro e que o fato de o juiz ter entrado com a impugnação não implica, necessariamente, que ele sabia dos dados cadastrados no mês de novembro de 2014.
“Ele entrou com a impugnação porque entrou um mês que não devia, e não pelos números, como o próprio tribunal reconheceu e corrigiu. Esse lançamento de decisões no sistema nós sabemos como é, tem decisão de intimação que consta como se fosse uma ‘decisão’. Não sou eu quem faz, é erro da assessoria, do sistema, não sei, mas aquilo lá é computado. Isso é preocupante, tenho certeza que o magistrado não fez de má-fé”, votou.
Também votaram pelo arquivamento os desembargadores Marcos Machado, Dirceu dos Santos, João Ferreira, Pedro Sakamoto, Marilsen Addario, Rondon Bassil, Maria Aparecida, Antônia Siqueira e Clarice Claudino. Desembargadores desconfiam de boa-fé Por outro lado, o desembargador Luiz Carlos da Costa não acreditou na versão do juiz Cássio Neto.
Segundo ele, apesar de haver possibilidade de a produtividade “exorbitante” ter sido inserida por erro, não seria crível que o juiz tenha ingressado com a impugnação sem ter lido estes dados. “Quando o magistrado impugna, não posso crer que ele não tenha lido aquilo, que ele próprio não desconfiou daquilo, pela desproporção. Ele deveria se assustar diante de quantidade de atos praticados. Algo deveria chamar a atenção do magistrado, até porque era materialmente impossível realizar tudo aquilo."
“É impossível impugnar um ato sem ler. Como alguém pode afirmar que o dado da Corregedoria era errado e o dado correto era outro, e depois diz que não sabia, que não viu, que não leu?”, afirmou.
Quem também criticou a conduta do magistrado foi o desembargador Orlando Perri, que classificou a versão de Cássio Neto sobre os fatos como uma “brincadeira” com a Inteligência do Pleno.
“É um disparate dizer que deu 63,4 sentenças de mérito por dia, além das 76 audiências. Efetivamente se realizou 14,6 audiências por dia? É assombroso. Eu não tenho como não concordar com o desembargador Luiz Carlos da Costa. Tanto sabia que se contava produtividade para fins de promoção, que as impugnou. Dizer que ele não sabia é brincar com a inteligência de todos nós. Ele impugnou e certamente deveria, no mínimo, saber que em cinco dias de trabalho não tinha condições de realizar esse número de audiências, de sentenças e de decisões”.
O voto pela instauração do processo disciplinar, no entanto, foi vencido. Além de Luiz Carlos e Orlando Perri, o voto pela continuidade da investigação foi dado pelos desembargadores Rubens de Oliveira, Juvenal Pereira, Sebastião Moraes, Rui Ramos Ribeiro e Guiomar Teodoro Borges.
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