LUCAS RODRIGUES
DA REDAÇÃO
A 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso adiou o julgamento dos habeas corpus que pedem a soltura dos ex-secretários de Estado Marcel de Cursi (Fazenda) e Pedro Nadaf (Indústria, Comércio, Minas e Energia e Casa Civil).
Os julgamentos foram colocados em sessão na tarde desta quarta-feira (29).
Ambos os ex-secretários estão presos desde setembro de 2015, por conta da Operação Sodoma. Eles requereram a revogação das prisões relativas à 2ª fase da operação, deflagrada em março deste ano.
Cursi e Nadaf são acusados de integrar suposta organização criminosa que teria exigido pagamento de propina a empresários para conceder incentivos fiscais e manter contratos com o Governo do Estado.
O dinheiro arrecadado seria posteriormente “lavado” e usado para pagamentos de despesas pessoais, campanhas eleitorais e favores políticos.
No caso de Cursi, o julgamento encontra-se empatado. O relator do caso, desembargador Alberto Ferreira, votou por manter a prisão preventiva. Já o desembargador Pedro Sakamoto se manifestou pela soltura do ex-secretário.
A decisão foi adiada em razão do pedido de vistas do juiz convocado Jorge Luiz Tadeu Rodrigues.
Quanto ao pedido de soltura de Nadaf, o adiamento ocorreu em atendimento ao Ministério Público Estadual (MPE), em razão da juntada de novos documentos pela defesa.
O MPE afirmou que queria formular um parecer sobre os novos fatos e a câmara concedeu 24 horas para a manifestação.
Julgamento de Cursi
O advogado Roberto Tardelli, que representa o ex-secretário Marcel de Cursi, afirmou que a juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, extrapolou sua jurisdição ao modificar “truculentamente” os termos de colaboração premiada e exigir que os ex-secretários e delatores César Zílio e Pedro Elias também fossem denunciados pelo MPE.
“Ao juiz é permitido adequar o acordo, e adequar é fazer pequenos ajustes. Mas quando a magistrada rompe o acordo e firma um novo acordo, ela acaba substituindo a parte. Ela não negocia, ela impõe um acordo”, disse.

Roberto Tardelli: "Ele [Cursi] foi solto como mentor intelectual e agora é preso de novo por ser mentor intelectual. Não é possível que criminalizemos o que não é delituoso"
Tardelli reclamou que Cursi estaria preso pela acusação de “mentor intelectual” do esquema, ser o responsável por criar “artimanhas jurídicas” para respaldar e garantir receita ilícita para o grupo criminoso, “elaborando normas ou arquitetando procedimentos, revestidos de falsa regularidade e legalidade”.
“Ele já era considerado mentor intelectual na primeira denúncia. Ele foi solto como mentor intelectual e agora é preso de novo por ser mentor intelectual. Não é possível que criminalizemos o que não é delituoso. Disseram que ‘ele elabora leis”. Quem elabora lei é parlamento, ninguém faz lei. Eu não posso imaginar que alguém possa ser criminalizado por mandar projetos de lei. Como pode dizer que ele era mentor intelectual porque recebia ordens do governo?”, questionou.
O relator do caso, desembargador Alberto Ferreira, afirmou que o pedido não preenche os requisitos, uma vez que a decisão que recebeu a denúncia da Sodoma teve “suporte empírico” e que não há, a princípio, qualquer nulidade no fato de a juíza Selma Arruda ter modificado os acordos de colaboração premiada.
Entretanto, o desembargador Pedro Sakamoto, apesar de não ter detectado ilegalidade no mandado de prisão, votou por conceder a soltura em razão de, em julgamento anterior, já ter declarado a juíza Selma Arruda como não imparcial para julgar as investigações da Sodoma.
“À primeira vista a decisão é correta, mas votei por acolher a exceção contra a juíza Selma Arruda e concluo que tal circunstancia não pode ser ignorada em sede de habeas corpus. Pela ausência de imparcialidade, tenho que a ordem deve ser concedida”, votou.
Em razão da complexidade do caso, o juiz convocado Jorge Tadeu resolveu pedir vistas para elaborar seu voto.
Julgamento de Nadaf
Em sustentação oral, o advogado Alexandre Abreu alegou que a colaboração premiada do ex-secretário de Estado de Administração, César Zílio, provaria que Pedro Nadaf não teria envolvimento com o esquema que teria ocultado o dinheiro de propina por meio da compra de um terreno de R$ 13 milhões.

Alexandre Abreu: "O povo não precisa de prisão, mas de ressarcimento ao erário em caso de condenação. Vamos praticar o direito penal da vingança?"
Segundo ele, a juíza Selma Arruda mandou prender Nadaf antes de homologar a colaboração premiada. Desta forma, conforme o advogado, a delação trouxe novos fatos que excluiriam a a participação de Nadaf nas tratativas relativas à 2ª fase da Sodoma.
Ele propôs a aplicação de medidas cautelares, como a tornozeleira eletrônica, e até mesmo o arbitramento de fiança para garantir a liberdade de Nadaf.
“Chegou a hora deste tribunal avaliar de maneira diferente. O povo não precisa de prisão, mas de ressarcimento ao erário em caso de condenação. Vamos praticar o direito penal da vingança?”, questionou.
Em razão da juntada da colaboração premiada de Zílio e dos fatos novos trazidos pela defesa, o procurador de Justiça Domingos Sávio pediu prazo para que o Ministério Público pudesse se manifestar, requerimento que foi atendido e motivou o adiamento do julgamento.
A denúncia da Sodoma
Segundo a denúncia, assinada pela promotora de Justiça Ana Cristina Bardusco, o grupo era dividido em várias ramificações, e cada uma delas possuía graus hierárquicos.
Silval Barbosa é apontado como o líder da organização, "responsável por articular e coordenar as ações dos demais integrantes". O grupo atuaria exigindo pagamento de propina para conceder incentivos fiscais e para manter contratos de empresas com o Governo do Estado.
Na divisão secundária figuram os ex-secretários de Estado Pedro Nadaf, Marcel de Cursi, Cezar Zílio e Pedro Elias; o ex-secretário adjunto de Administração, coronel José Jesus Nunes Cordeiro; o ex-chefe de gabinete de Silval, Sílvio Cézar Correa Araújo; o ex-procurador do Estado Chico Lima; a ex-secretária de Nadaf na Fecomércio, Karla Cintra; e o filho de Silval, o médico e empresário Rodrigo Barbosa.
“Os indícios apontam que a organização criminosa atuou de forma perene durante toda a gestão de Silval Barbosa, provocando prejuízo a toda a população mato-grossense, que até hoje arca com as consequências das ações criminosas de seus membros, frente ao sucateamento da máquina administrativa, ausência de investimento em infraestrutura, na saúde, segurança e educação pública, etc”, diz trecho da denúncia.
Já o ex-deputado José Riva foi denunciado após o depoimento do empresário Paulo Mischur, da empresa Consignum, alvo da 2ª fase da Sodoma. Mischur relatou ter pago R$ 17,6 milhões ao grupo liderado por Silval e a José Riva para manter o contrato com o Estado.
O ajuste da propina, conforme a ação, teria sido feito com a ajuda do empresário Tiago Dorileo, que também é alvo da Operação Ararath.
O grupo também teria exigido R$ 1 milhão da Zetra Soft, do empresário Fábio Drumond, para que a empresa passasse a gerenciar os empréstimos consignados dos servidores – tarefa então feita pela Consignum.
A tratativa, no entanto, acabou não sendo efetivada e o contrato – assim como as supostas propinas pagas para mantê-lo – continuou com a empresa de Mischur.
Também foi denunciado o servidor Bruno Sampaio Saldanha. Ele teria exigido propina para fazer “vistas grossas” ao contrato da empresa Webtech, de Julio Tisuji, que também confessou ter pago valores ao grupo.
Quanto ao prefeito cassado de Várzea Grande, Walace Guimarães, consta na denúncia que ele ofereceu R$ 1 milhão, em 2012, ao então secretário de Administração, César Zílio, para que o poder público pagasse valores a gráficas – por serviços inexistentes ou incompletos - no intuito de levantar dinheiro para pagar custos de campanha.
Entre as gráficas estavam as de propriedade dos empresários Antônio Roni de Liz e Evandro Gustavo Pontes da Silva, igualmente denunciados.
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