DO CONJUR
A 2ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros, em São Paulo, condenou a Editora Abril a pagar R$ 54,5 mil à Yeda Crusius (PSDB), que governou o Rio Grande do Sul entre 2007 e 2001. A juíza Cláudia Thomé Toni, que proferiu a sentença, entendeu que a revista Veja feriu a honra e a imagem da então governadora, pois agiu sem cautela ao não deixar claro que as denúncias citadas na reportagem já haviam sido arquivadas. A principal entrevistada também negou, em juízo, o teor das denúncias contra a governadora. A reportagem foi publicada na edição número 2112, de 13 de maio de 2009, às páginas 64, 65 e 66, sob o título "O Caixa Dois do Caixa Dois". Da decisão, cabe recurso.
Veja afirmou na reportagen que teve acesso a gravações com conversas de Marcelo Cavalcante, ex-assessor de Yeda assassinado em Brasília, denunciando irregularidades na campanha eleitoral de 2006, além do desvio de verbas no Detran — caso que desencadeou a Operação Rodin, da Polícia Federal, em 2007.
A revista também publicou uma entrevista com a companheira de Marcelo, a empresária Magda Koenigkan. Dentre as confissões de Marcelo, que trabalhou na arrecadação de fundos para a campanha eleitoral, Magda afirmou a existência de um "caixa dois do caixa dois" para aumento do patrimônio pessoal da governadora, inclusive para a compra de uma casa; que Yeda sabia dos desvios de verbas no Detran; e que as despesas da campanha teriam sido pagas pela agência de publicidade DCS.
Na edição da semana seguinte, de número 2113, nas páginas 62 e 63, Veja voltou à carga contra a governadora. Desta vez, mostrou que recursos da agência não entraram oficialmente na contabilidade do partido.
Em juízo, a defesa da ex-governadora afirmou que o processo-crime instaurado em 2008, para apurar irregularidades na aquisição do imóvel no bairro Petrópolis, avaliado em R$ 750 mil, acabou arquivado em dezembro de 2008, depois do parecer do procurador-geral de Justiça Mauro Renner. O MP entendeu que a compra foi feita com recursos pessoais. Quanto à regularidade das doações da produtora de fumo Alliance One, a defesa de Yeda sustentou que a contribuição foi regular, tanto que a empresa apresentou recibo do pagamento.
Citada, a Editora Abril alegou que apenas observou seu direito de informar, como garante a Constituição. Em síntese, argumentou que não houve afirmação falsa ou imputação de crime à ex-governadora, mas apenas divulgação das provas até então colhidas pelas investigações sobre fraudes no Detran e de desvios na campanha eleitoral.
"Razão assiste à autora neste caso, no que tange a sua honra e imagem", escreveu na sentença a juíza Cláudia Thomé Toni. "O comprometimento com a verdade é essencial neste momento, pois é fato que qualquer descompasso com a realidade pode fulminar, em segundos, o nome e a imagem de qualquer cidadão que tenha a sua vida mencionada em reportagem de revista tão conceituada e de tanta divulgação no mercado."
Conforme a juíza, no afã de obter um "furo de reportagem", Veja não teve o cuidado de obter a concordância de Magda do teor de suas declarações, nem de citar que as denúncias de aquisição irregular do imóvel foram arquivadas pelo MP. Em juízo, a empresária confirmou ter dado a entrevista, mas que se limitou a reconhecer a voz de Marcelo nos trechos das gravações em podia reconhecê-lo — e nada mais. Em suma: confirmou aos repórteres apenas os fatos notórios que já estavam sendo investigados pelo MP.
A juíza afirmou que a reportagem de Veja, entretanto, não trouxe apenas relatos de fatos notórios das investigações em curso, mas detalhes sobre repasse de valores à governadora; de valores pagos pelo imóvel; de irregularidades na campanha eleitoral. "A falta de cautela da ré (Veja) impede que possamos concluir pela veracidade dos relatos da depoente (Magda) na ocasião, o que torna mais subsistente as alegações da autora quanto à repercussão negativa das notícias em tela", ponderou. Afinal, "a testemunha (Magda) não confirmou em juízo que realmente concedeu à ré (Veja) os detalhes divulgados na reportagem; por isso, agora, não se pode sustentar que a ré cumpriu seu compromisso com a verdade que lhe foi dita".
A titular da 2ª Vara Cível do Foro Regional de Pinheiros concluiu que Veja usufruiu de forma nociva da liberdade de imprensa, ofendendo, de modo ilegal, a reputação da ex-governadora, ao noticiar fato desprovido de comprovação e atribuindo a ela a prática de conduta ilegal e que ainda é objeto da apuração das autoridades.
O quantum indenizatório por danos morais foi arbitrado em R$ 54,5 mil, o equivalente a 100 salários-mínimos na data em que a sentença foi proferida, em 24 de novembro de 2011.
Clique aqui para ler a reportagem de Veja e aqui para ler a sentença.
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