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OPINIÃO Quinta-feira, 23 de Fevereiro de 2012, 11:05 - A | A

23 de Fevereiro de 2012, 11h:05 - A | A

OPINIÃO / MARLON REIS

Ficha Limpa, garantias e democracia direta

Recurso não suspende por si só a decisão que originou a inelegibilidade

MARLON REIS



(Resposta à crítica à Lei da Ficha Limpa postada em seu site pelo jornalista Luís Nassif)

Agora que a Lei da Ficha Limpa se tornou uma realidade incontornável, é natural que surjam alguns questionamentos quanto ao seu impacto nas nossas instituições políticas.

Não voltarei aqui aos temas jurídicos já devidamente enfrentados pelo Supremo Tribunal Federal. Registro apenas, quanto ao ponto, que a Suprema Corte não teve, afinal, maior dificuldade em superar as questões de fundo constitucional alusivas ao cerne da Lei da Ficha Limpa. Vitória plena e, para os que conhecem a Suprema Corte, bastante confortável.

Ao fim e ao cabo, a Lei da Ficha Limpa teve confirmados na íntegra todos os seus novos enunciados.

Recebi do amigo Mario Bonsaglia um tweet que, pela origem, não dava para ignorar. Trazia um link para ao site do Luís Nassif, onde este vaticinava: “Delega-se ao Poder Judiciário estadual - em todos os estados - o poder de decretar a morte política, como se fossem infensos à ação dos coronéis locais”.

Vindo do Nassif, não se pode deixar de levar em consideração. Vale a pena até roubar umas horas ao carnaval para tentar alguma resposta. Ele parece pensar que a Lei da Ficha Limpa fragiliza o sistema de garantias, abrindo a coronéis-oligarcas o poder de decretar a morte política de adversários utilizando-se da atuação dos tribunais. Faz-me lembrar o Victor Nunes Leal em seu “Coronelismo, enxada e voto”. Ou os caciques de Espanha, que tinham no Judiciário, como na Administração, a base do seu poder local.

Quando o assunto é tratado, cita-se sempre um exemplo do Amapá, onde teria sido cassado um político conhecido por sua luta em favor do meio ambiente e contra a ditadura. O tema ganha os foros do emocional: um mártir perseguido por meio do Judiciário. O caso é que, julgado no seu Estado, ele foi mantido no cargo. A cassação aconteceu no TSE. Não importa aqui saber se o julgamento do TSE foi justo ou não, nem me caberia adentrar esse mérito. O que interessa é que o exemplo simplesmente não serve, já que a cassação ocorreu na Capital Federal.

O mesmo se pode afirmar de outro caso, este ocorrente no meu Maranhão, estado que escolhi para viver e que julgo conhecer bastante. Aliás, tenho sido magistrado aqui nos últimos quinze anos. Aqui também a cassação de um adversário se deu no âmbito do TSE. Nenhuma das hipóteses tem, pois, nada a ver com o sistema adotado pela Lei da Ficha Limpa.

Note-se que os recursos dos julgamentos tomados pelos TREs nos estados são submetidos a rigoroso filtro. Em regra só algumas matérias - não a discussão sobre a prova, por exemplo - podem ser levadas à reapreciação pelo TSE. Mesmo assim, não parece que tenhamos no Brasil notícias de uma caça a inimigos dos oligarcas nos tribunais regionais eleitorais.

Mas isso é outra história. Não me atrevo a discorrer sobre oligarquias, já que este não parece ser o patamar histórico em que o Brasil inteiro se encontra. E não vamos nivelar o Brasil inteiro por alguma exceção territorialmente concentrada.

Vamos então falar sobre as inovações ao sistema de garantias eleitorais inaugurado pela Lei da Ficha Limpa.

Em primeiro lugar, decidiu-se pela necessidade de que um órgão colegiado (normalmente um tribunal) emita a condenação marcada com a nota da inelegibilidade. Isso impede que um só magistrado, mesmo um presidente de tribunal, imponha a medida que implica no afastamento da candidatura. Pluralizar a fonte do julgamento já é um meio assegurar garantias. Evita-se o risco da influência sobre um julgador isolado.

Esse julgamento colegiado estará forçosamente acompanhado pelo Ministério Público e pelas partes legitimadas. Nada pode ocorrer sem que a própria parte tenha ciência de cada momento processual.

Daí decorre que muitos poderão se valer de recursos e, conforme o caso, até da provocação do Conselho Nacional de Justiça, recentemente fortalecido em seus poderes pelo Supremo Tribunal Federal. O CNJ, aliás, já demonstrou sua autoridade ao afastar até mesmo o presidente de um Tribunal de Justiça, caso que aqui tomo como exemplo. Já deu firmes e ponderadas provas daquilo a que veio.

Convém afirmar que a Lei da Ficha Limpa não alterou em nada o devido processo legal. Não houve a supressão de nenhum mecanismo processual hábil a buscar a modificação de eventual decisão que se considere injusta.

Mas há um detalhe que não pode passar sem a devida consideração. A Lei da Ficha Limpa simplesmente prevê que o tribunal a quem toca o julgamento do recurso (um tribunal superior em Brasília, portanto) poderá “suspender a inelegibilidade sempre que existir plausibilidade da pretensão recursal e desde que a providência tenha sido expressamente requerida, sob pena de preclusão, por ocasião da interposição do recurso” (art. 26-C).

Ou seja, a palavra final sobre a possibilidade de participação eleitoral continua fora do âmbito estadual. Mas isso não implica dizer, de modo algum, que as coisas não mudaram.

A diferença do sistema adotado pela Lei da Ficha Limpa em relação ao permissivo modelo anterior pode ser resumida da seguinte maneira:

antes a simples interposição de um recurso qualquer, por mais desarrazoado que fosse, mantinha possível a candidatura. Passada a eleição, mesmo sobrevindo a confirmação da decisão condenatória, ainda assim sobrevivia o mandato, já com seu detentor protegido pelas benesses da imunidade e do foro privilegiado;
agora o recurso não suspende por si só a decisão que originou a inelegibilidade. É preciso convencer o relator no tribunal superior que há indícios sérios de injustiça no julgado. Se isso acontecer, concedida a liminar, a candidatura se viabiliza, mas com um detalhe: o julgamento do recurso ganhará prioridade no tribunal de destino. E se a condenação for posteriormente confirmada o mandato estará automaticamente desconstituído.

Trata-se de um modelo muito rico. Tem fundamento na ideia de garantia para a sociedade, mas esquece do candidato. O sistema anterior colocava os interesses individuais do candidato acima dos direitos de toda a coletividade dos cidadãos. Agora inaugurou-se um modelo em que os direitos do indivíduo sobrevivem, mas estão sujeitos à proteção jurídica prioritária da maioria. Na dúvida, resolve-se em favor da sociedade.

As inelegibilidades não se fundam na ideia de culpa. O Supremo Tribunal Federal sempre soube disso. Existem precedentes de 1990 dizendo que “inelegibilidade não constitui pena”. Então dizer que o princípio da presunção de inocência é de aplicação obrigatória constitui, com todo respeito, uma rematada falácia.

Por fim, quero dizer que alguns vem fazendo, de forma nitidamente preconceituosa, alusão à Lei da Ficha Limpa como proveniente de uma “turba, ignara ou não”. A Lei da Ficha Limpa é oriunda de uma iniciativa popular de projeto de lei. Está lá na Constituição esse mecanismo de expressão da democracia direta (art, 14, III). Estava lá para não ser usado..., mas nós o utilizamos. O que chamam de turba trata-se na verdade do soberano popular, ele mesmo falando diretamente ao Estado qual é a sua vontade. Deve haver algum valor nessa forma de expressão direta do soberano prevista na Lei Fundamental.

À frente da Campanha Ficha Limpa não estão, por outro lado, ignorantes ou fascistas. Estão todos os movimentos que, juntos, colaboraram para a decorracada da ditadura e para a pouca afirmação de direitos humanos que temos em nosso País. Estão ali presentes a OAB, a CNBB, o Instituto dos Advogados do Brasil, a ABI, o Fórum Nacional de Direitos Humanos, a ABONG, o INESC, além de incontáveis outras organizações sociais.

Entre os juristas que dão apoio ou participaram da iniciativa estão Dalmo Dallari, Fabio Konder Comparato, Hélio Bicudo, Paulo Bonavides, João Baptista Herkenhoff e muitos outros de grande envergadura moral e científica.

A dona de casa, a manicure, a estudante, o padeiro, o gari e o advogado têm o direito constitucional de manifestarem seu desejo político de ver modificada a realidade política que os cerca. Não precisam de tutores partidários ou sindicais para lhes assegurarem de forma paternal esse direito.

O caso é que o mundo e o Brasil estão mudando e há gente correndo o risco de perder o bonde. As antinomias direita e esquerda, coronéis e progressistas, capitalistas e socialistas bastavam para explicar o mundo até bem pouco tempo. Agora não mais.

A grande maioria nunca pôde sentar-se à mesa. Quando se aproxima, é como se viesse a patuléia, o poviléu, o populacho, o povaréu, a ralé ou simplesmente a turba.

Esses que nunca se sentaram à mesa estão mudando de postura.

Os membros do movimento Occupy Wall Street, animados pela mesma observação, expunham cartazes que diziam: “nós somos a maioria”.

A maioria brasileira nutre asco por qualquer forma de ditadura e não está preocupada em empurrar quem quer que seja para fora dessa mesa redonda que é o Brasil. Ela simplesmente quer se sentar para conversar, com a certeza de que as suas palavras serão levadas em consideração por todos os que sempre foram ouvidos anteriormente, mas principalmente por todas as instituições públicas, que uma certa Constituição quis submeter ao poder de um tal “povo”.

Agora o povo, ao qual o parágrafo único do art. 1o. da CF chama de “soberano”, faz lei. E o faz derrubando cânones que nunca tiveram nada a ver com o Direito Eleitoral. Inverteu-se a lógica: do individual para o comunitário; do pessoal para o público; do “meu” para o “nosso”.

Esse povo é composto por pessoas que, nas palavras de Leonardo Boff, “Querem uma democracia que se constrói a partir da rua e das praças, o lugar do poder originário. Uma democracia que vem de baixo, articulada organicamente com o povo, transparente em seus procedimentos e não mais corroída pela corrupção”.

O soberano tem o direito - o art. 14, parágrafo nono, da CF está a assegurá-lo - de ver definido em lei complementar o perfil esperado dos seus candidatos. Essa faculdade nunca havia sido utilizada. O Congresso claudicava desde 1993, dexiando de apreciar pelo menos uma dezena de projetos de lei de iniciativa parlamentar existentes sobre o tema. Dessa vez valeu. 

MARLON REIS é juiz no Maranhão e um dos coordenadores nacionais do MCCE.

Veja aqui o comentário de Luis Nassif que motivou o artigo do magistrado: 

Ficha limpa e a presunção da inocência

Enviado por luisnassif, sex, 17/02/2012 - 16:40

Por Affon

Foi esse mesmo clamor público que pixou e depredou a Escola Base.

Foi esse mesmo clamor público que apoiou as teses de Carl Schmitt.

Foi esse mesmo clamor público que apoiou os julgamentos em estádios de beisebol nos primeiros dias da Revolução Cubana.

O clamor público não é medida de justiça.

Por José DF

Para os leguleios de plantão, assegurar a presunção de inocência nos moldes

atuais implica na manutenção de um sistema recursal esdrúxulo que acaba por fraudar o devido processo legal

e, por conseguinte, inviabilza o trânsito em julgado. Deste modo, segurança jurídica, razoabilidade,

proporcionalidade e moralidade, entre outros princípios, vão para o ralo da impunidade.

Por Luís Nassif

Concordo com a posição de Fon.

Delega-se ao Poder Judiciário estadual - em todos os estados - o poder de decretar a morte política, como se fossem infensos à ação dos coronéis locais.

O caso Capiberibe é exemplar. Foram abertas dezenas e dezenas de ações contra ele e seus auxiliares. Alguns foram processados até por alugar linhas telefônicas. Com o STF se curvando ao clamor público, conferiu-se a Sarney o poder de liquidar adversários no Amapá e no Maranhão, só para um exemplo simples.

A alegria pelo fim de Joaquim Roriz não compensa o espaço político adicional para que qualquer chefe político estadual, em estados menores, se perpetue com a cumplicidade da justiça local.

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