SILVANA CORREA VIANNA
Não há como permanercermos silentes diante da discussão em torno de duas decisões do STJ que reconhecem o foro por prerrogativa de função a agentes políticos em ações de improbidade administrativa. Tais decisões divergem do posicinamento dominante dos tribunais superiores, causando grande desconforto aos operadores do direito que militam com a matéria.
Por envolver agentes políticos nacionalmente conhecidos, as decisões ganharam espaço na midia nacional e local, levando muitos a se posicionarem contra e a favor do reconhecimento do foro por prerrogativa de função. Alguns se posicionaram de forma coerente, discutindo a matéria com seriedade, outros, por sua vez, aproveitaram para fazer sensacionalismo, pouco se importanto com a sua função primordial que é informar ao cidadão comum.
Com a devida atenção aos acontecimentos, os membros da Comissão Permanente de Combate à Corrupção e Defesa do Patrimônio Público – COPEPP¹ vem discutindo a questão com os seus membros, adotando como premissa o bem elaborado estudo da colega Isabel Cristina Pinheiro, Promotora de Justiça coordenadora do CAOP-PP, do Rio Grande do Norte²
“Data venia”, discordamos do equivocado entendimento do STJ, em dois únicos julgamentos nesse sentido, que adota a 'Teoria da Competência Implícita', da Constituição Federal, tomando como base a Questão de Ordem nº 3.211-0 do STF, interpretando ser cabível o foro privilegiado e competência originária dos Tribunais nas ações de improbidade administrativa aos agentes políticos.
Ao leitor atento, sugerismo a comparação entre o fundamento do julgado do STJ (27/09/2011)³ e a decisão na Questão de Ordem mencionada (13/03/2008)4. A Corte Máxima apenas adequou suas decisões anteriores a uma situação específica, reconhecendo o sistema escalonado de posição jurisdicional hierárquica, tanto que vem mantendo seu posicionamento quanto ao não reconhecimento de prerrogativa de foro nas ações civis públicas aos agentes políticos.
O nosso regime constitucional, seguindo a linha diretriz de todas as constituições republicanas, adota o sistema de exclusividade constitucional para criação de privilégios de foro assim como sobre a competência originária dos Tribunais, portanto somente pode ser alterado mediante Emenda Constitucional.
Curvando-se à soberania da Constituição, o STF declarou a inconstitucionalidade da Lei 10.628/2002, que acrescentou os §§ 1º e 2º ao art. 84 do CPP, e assim vem mantendo seu entendimento, p. ex., nos seguintes julgados: Agravo de Instrumento nº 506323, 02/06/2009 - Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma5; Agravo de Instrumento nº 554398, 19/10/2010 – Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, 1ª Turma 6.
Vale lembrar que a Lei 8.429/92 – Lei da Improbidade Administrativa – é uma conquista de toda a sociedade brasileira no combate a corrupção ao não conceder aos agentes públicos e políticos privilégio de foro, possibilitando com isso uma atuação presente e permanente do Ministério Público e do Poder Judiciário de primeiro grau em todas as comarcas deste país, por mais longínquas que sejam das respectivas capitais.
Conceder privilégio de foro a agentes políticos nas ações de improbidade administrativa seria praticamente compactuar com a impunidade, uma vez que as Procuradorias de Justiça não teriam condições de instaurar e instruir inquéritos civis contra vereadores e prefeitos dos 5.564 minicípios, espalhados em aproximadamente 8,5 milhões de km², muito menos os Tribunais de Justiça processar e julgar as referidas ações.
Quando o Legislativo, através da Lei 10.628/2002, concedeu privilégio de foro nas ações de improbidade administrativa, o Ministério Público Nacional, através da CONAMP, ingressou com a ADI 27977, saindo vitoriosa a sociedade por ele representada.
Assim, a Procuradoria Especializada na Defesa do Patrimônio Públido e Probidade Administrativa do MPMT entende que acatar duas decisões isoladas do STJ, as quais representam um retrocesso nas conquistas do nosso regime democrático, não coaduna com o perfil combativo do Ministério Público Nacional. Por derradeiro, acreditamos no poder de mobilização da classe e na reversão de tais julgamentos na Corte Suprema do país.
NOTAS:
¹ A COPEPP é uma comissão nacional, especializada na defesa do patrimônio público, formada por um representante de cada Estado, que juntamente com o GNCOC – Grupo Nacional de Combate ao Crime Organizado, compõe um dos grupos auxiliares do CNPG – Conselho Nacional de Procuradores Gerais.
² Consulta nº 0806/2011 -CAOP-PP/MPRN - publicado no sítio eletrônico da PJE-DPP/MPMT
³ Disponível em:
4 Disponível em:
5 Disponível em:
6 Disponível no link:
7 Disponível no link:
SILVANA CORREA VIANNA é procuradora de Justiça em Mato Grosso
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