MARCELO FERRAZ
O dia 07 de dezembro de 2016 ficou conhecido como a data em que alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) transformaram a instância jurídica maior da república em uma corte de consulta imperial. Isso porque, neste dia turvo o STF perdeu a independência constitucional para, através de um conchavo político, pôr a coroa da impunidade em José Renan Vasconcelos Calheiros.
A decisão de manter o peemedebista no cargo de presidente do Senado Federal não levou em conta a vida pregressa criminal do acusado. Renan é alvo de 12 inquéritos no STF, incluindo oito relacionados à Operação Lava Jato. Segundo as investigações, supostamente Renan Calheiros e Lula seriam os chefões da quadrilha que estaria articulando os desvios bilionários junto à Petrobrás para irrigar o sistema político no país.
A liminar, concedida monocraticamente pelo Ministro Marco Aurélio Mello para afastar o presidente do senado, foi reformulada pelo STF na última quarta-feira (07). A Corte Jurídica o manteve no comando da instituição, porém a decisão o impede de assumir a Presidência da República caso ocorra a vacância do cargo na linha sucessória constitucional.
A liminar foi analisada pelo STF porque Renan se tornou réu em uma ação penal em razão de uma movimentação financeira suspeita de R$ 5,7 milhões. O inquérito original surgiu de suspeitas de que um lobista ligado à empreiteira Mendes Júnior pagava a pensão de uma filha que Renan teve fora do casamento com a jornalista Mônica Veloso. O escândalo, ocorrido em 2007, foi uma dos fatores que levou Renan, à época, a renunciar à presidência do Senado.
Entretanto, a decisão também não levou em conta o mérito porque recentemente o Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, relator da Operação Lava Jato, determinou, no dia 05 de maio, o afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do mandato de deputado federal e, consequentemente, da presidência da Casa.
Na ocasião, os 11 ministros do STF mantiveram a suspensão do mandato parlamentar e o afastamento por tempo indeterminado do deputado da presidência da Câmara, justamente porque ele estava atrapalhando as investigações da Lava Jato, na qual o deputado é réu em uma ação e investigado em vários procedimentos.
Contudo, a expressão “dois pesos e duas medidas” pode explicar a falta de imparcialidade do STF, pois em todas as investigações feitas pelo MPF e pela PF Renan é apontado como um dos mentores que articularam o esquema do Petrolão, bem como é o principal suspeito que vem atuando no sentido de impedir a continuação da Lava Jato.
Renan já disse que é terminantemente contra a aprovação da lei que derrubaria o foro privilegiado dos políticos. Além disso, ele também tinha interesse em aprovar a lei que anistiava o crime de Caixa II. Mas o fato mais preocupante foi ele querer, um dia antes do seu julgamento, tentar votar, em caráter de urgência, o projeto de lei que prevê punição a juízes e para membros do Ministério Público por abuso de autoridade.
A verdade é que o STF ficou intimidado pelas inúmeras artimanhas de Renan e Michel Temer: de tentar refrear as investigações da Operação Lava jato. Assim, diante de uma crise institucional, que agravaria ainda mais a crise econômica, a Máxima Corte humildemente levantou a bandeira branca e tomou uma decisão exclusivamente política, desmoralizando o Ministro Marco Aurélio com a anulação da ordem judicial expedida por ele que, de forma antirrepublicana, foi descumprida pelo então presidente da Casa de Leis.
Daqui para frente que isenção e moral os ilustres ministros do STF terão para julgar os processos decorrentes da Operação Lava jato? Imagina a pompa com a qual o senador Renan Calheiros chegou ao Congresso Nacional após ser coroado pelo STF como o político que ganhou uma batalha entre o Poder Legislativo e o Poder Judiciário?
Isso mesmo, ele entrou nos corredores do Senado como um dos reis do teatro “republicano” brasileiro. Contudo, isso tudo pode ter ocorrido porque Temer era o regente da manobra política que iria reconduzir Renan ao cargo. Caso Renan deixasse a presidência, o PT poderia tumultuar e protelar a aprovação da PEC dos gatos públicos, e isso não fazia parte dos planos de Michel Temer.
Diante de todos esses fatos – em que a tripartição dos poderes “independentes” curva-se aos pés do comandante maior do Executivo, para salvaguardar um projeto aristocrático, fica a dúvida se realmente estamos vivendo em uma república democrática ou se ainda há vestígios de um regime absolutista imperial. Pelo jeito que a carruagem está andando, tudo pode acontecer neste país, ou melhor dizendo, neste reinado.
Marcelo Ferraz é escritor e jornalista.
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