EDUARDO MAHON
Mais um artigo sobre eleições? Sim e não. Vou tratar sobre uma eleição especial que guarda íntima relação com a sociedade, muito embora não haja participação geral. Aproxima-se a escolha do Procurador Geral de Justiça, em Mato Grosso. Trata-se do chefe da instituição que reúne funções constitucionais que são essenciais para a sociedade e, por isso, despertam tanto interesse. O perfil dos candidatos nos diz muito sobre a vontade do eleitorado, circunscrito a promotores de carreira, ao contrário de vários países. Há modelos de indicação e outros, eleitos de forma direta pela população. Em análise do Poder Judiciário pelo mundo, dá-se o mesmo: concurso, indicação ou eleição. Cada nação tem o modelo que entenda adequado, comunicando-se mais ou menos francamente com a comunidade.
No Brasil, é necessário o concurso, atendendo aos princípios republicanos da impessoalidade. Bom que seja assim. No entanto, mesmo com o distanciamento da interferência social no processo eletivo, o candidato importa porque importam as inclinações de cada um: mais diálogo social ou mais diálogo institucional, defesa de direitos difusos ou prevalência de núcleos de combate ao crime organizado, combate por condições de trabalho e aporte salarial ou aprimoramento no serviço de atendimento. São variadas questões que envolvem o Ministério Público, todas elas refletindo no que podemos esperar em termos de combatividade, de comunicação, de independência, entre outras variáveis igualmente essenciais.
Atualmente, o promotor pode votar em até três candidatos. Um contrassenso. Forma-se uma lista que vai para que o Governador decida entre três nomes. Outro contrassenso. Esse dois equívocos cumulados produzem distorção na independência que o órgão reclama. Primeiramente, não há um “voto de qualidade” ou um “critério de peso” nesses três votos simultâneos. Assim, os escrutinadores nunca saberão em que o promotor votou como “preferencial”, se houver mais de um voto na cédula. Quando há mais de um candidato assinalado, não há ordem: primeira opção, segunda opção e por aí em diante. O resultado não traduz a vontade objetiva da categoria de forma inequívoca, porque haverá a ponderação entre votos isolados e casados.
Afora esse ruído na revelação da vontade da maioria dos promotores, há uma questão que precisa ser urgentemente superada. Se o Ministério Público é uma instituição independente – como deve ser – não é possível que o chefe do Executivo possa, de forma arbitrária, escolher entre três nomes. Não deveria haver lista tríplice e, caso se mantenha, o candidato mais votado deveria ser empossado, passando ao largo do placet governamental. É que o Ministério Público pode voltar-se contra atos governamentais, devendo o procurador-geral assinar petições, requerimentos, notificações contra aquele que o nomeou. Pode ou não causar constrangimentos. Importa apenas que a independência conceitual deveria ser mantida, desde a gênesis do processo de escolha interna até a posse. Acredito que a grande maioria dos promotores pensa dessa forma.
A consulta direta a uma categoria é sempre mais saudável do que indicações indiretas. É claro que surge a eterna desconfiança sobre o papel das condições financeiras dos candidatos, juntamente com o uso da máquina. Evoluímos para uma Justiça Eleitoral bastante criteriosa. É preciso começar a usar os mesmos mecanismos para eleições de representações classistas, mormente se tratando de cargos públicos. Sustento o mesmo para a Ordem dos Advogados do Brasil em suas indicações para o quinto constitucional em tribunais. Primeiro, os advogados aptos a votar devem ser consultados de forma direta. Segundo que o nome sufragado em primeiro lugar deve tomar posse nos tribunais, sem necessidade do “de acordo” governamental. É muito mais fácil evitar o lobby em eleições abertas – reguladas por meio de uma disciplina interna – do que preveni-lo na hora das conversas políticas que perpassam a eleição e a nomeação. Os métodos de persuasão do governante em nomear este ou aquele jamais serão sabidos ao certo, enquanto a eleição aberta está toda jungida à normas que limitam abusos.
Para emprestar ainda mais credibilidade às eleições classistas, é preciso seguir critérios éticos muito simples: a desincompatibilização do cargo para quem concorre nas eleições, seja para que cargo for; a declaração pública de recebimento de valores de quaisquer naturezas; a punição ao abuso do poder econômico pessoal ou institucional; a regulação do direito de propaganda para conferir igualdade de condições entre os candidatos; a promoção de debates entre os interessados e meios para que o eleitorado possa assisti-los. O Poder Judiciário já começa a ensaiar eleições diretas. Mas precisamos evoluir juntos de forma madura, serena, pautados não em casuísmos de nomes e circunstâncias, mas em pilares conceituais mais sólidos.
Eduardo Mahon é advogado.
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