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OPINIÃO Sábado, 06 de Janeiro de 2018, 11:49 - A | A

06 de Janeiro de 2018, 11h:49 - A | A

OPINIÃO / ULISSES RABANEDA

Mudanças no Código de Trânsito

A alteração, diferente do que se fala, nada mudou quanto ao crime conhecido como “dirigir sob influência de álcool”

ULISSES RABANEDA



Feliz ano novo a todos! Que tenhamos um 2018 abençoado.

Começo o ano abordando em rápidas linhas uma alteração legislativa que está dando o que falar.

Longe da profundidade que o tema merece e da formalidade de um artigo de opinião, uso este espaço com a pretensão de inaugurar um bate-papo sobre o tema. Fiquem, pois, a vontade para deixar seu comentário, sua opinião, seja você da área do direito ou não.

No dia 19.12.2017, o presidente da República sancionou a lei n. 13.546, que, em síntese, fez alterações no Código de Trânsito Brasileiro.

Rapidamente espalharam-se pela internet uma série de comentários a respeito da nova norma, e, como não poderia ser diferente, a grande maioria sem qualquer sentido técnico-jurídico.

A bem da verdade, tais informações distorcidas, equivocadas, que passam como verdade, nada mais são do que as chamadas fake news, construção nociva que nos mostra que temos que nos reeducar sobre como receber, processar e repassar informações obtidas no ambiente virtual.

A alteração legislativa, diferente do que se propalou, nada mudou quanto ao crime popularmente conhecido como “dirigir sob influência de álcool”, previsto no Art. 306 da lei 9.503/97.

Em relação a este crime, tudo continua como antes, ou seja, com sanção corporal de seis meses a três anos de detenção, além de cominações acessórias.

O que a nova lei veio a qualificar foi a pena para o homicídio e a lesão corporal culposa cometidos na direção de veículo automotor, quando combinados com a ingestão de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência.

Em outras palavras, agora, quem ingerir bebida alcóolica, dirigir e culposamente causar um homicídio, estará sujeito a uma pena de cinco a oito anos de reclusão, além de sanções acessórias. Antes, a pena era de dois a quatro anos de detenção, combinada, de igual modo, com punição acessória.

O que a nova lei veio a qualificar foi a pena para o homicídio e a lesão corporal culposa cometidos na direção de veículo automotor, quando combinados com a ingestão de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência

De modo sensivelmente diverso, agora, quem dirigir com a capacidade psicomotora alterada em razão da ingestão de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência, causando lesão corporal culposa, a pena será de dois a cinco anos de reclusão, enquanto antes era de seis meses a dois anos de detenção.

Algo que até agora passou in albis pelas manifestações mais abalizadas, foi o fato de que o legislador, na alteração promovida, diferenciou os elementos normativos dos tipos penais do homicídio e da lesão corporal culposa quando combinados com bebida alcóolica.

Veja que enquanto no homicídio culposo, para que incida a pena qualificada, é necessário apenas que o agente tenha conduzido o veículo “sob a influência de álcool [...]”, enquanto na lesão corporal culposa, para que haja a subsunção do fato ao novo preceito legal, é necessário que o agente tenha conduzido o veículo com a “capacidade psicomotora alterada”.

Dito de outro modo, quem ingerir bebida alcóolica, dirigir e matar alguém culposamente, a pena será de cinco a oito anos de reclusão, enquanto que na lesão corporal culposa, para que a pena seja de dois a cinco anos, não bastará ter ingerido bebida alcóolica como naquele.

Será necessário, neste último caso, que, da ingestão, o agente tenha ficado com a capacidade psicomotora alterada, pois, do contrário, a pena será de seis meses a dois anos de detenção.

Resta corrigir outras distorções. Diferente do que se disse, o homicídio culposo na direção de veículo automotor, após ingestão de bebida alcóolica, não passou a ser inafiançável. A única diferença é que, agora, apenas o Juiz pode arbitrar fiança, não mais o delegado de polícia.

O flagrado, portanto, será submetido a audiência de custódia, obrigatoriamente. Aqui, outro ponto a debater: Poderá o Juiz, na custódia, converter o flagrante em preventiva? A meu Juízo, em regra não!

Isto porque restou hígida a regra do Art. 313, I do Código de Processo Penal, que somente admite prisão preventiva para crimes dolosos com penas máximas superiores a quatro anos. A única exceção ocorre no caso de o flagrado já ter sido condenado em definitivo por outro crime [Art. 313, II do CPP].

Assim, a despeito do Juiz, em regra, não poder converter o flagrante em preventiva na audiência de custódia, poderá ele conceder liberdade provisória mediante arbitramento de fiança, fixando-a em patamares adequados, inclusive para eventual e futura reparação do dano à vítima ou seus familiares [Art. 336 do Código de Processo Penal].

Eventual permanência do flagrado em prisão cautelar, nestes casos, decorreria apenas do não pagamento da fiança arbitrada na audiência de custodia, não de uma conversão do flagrante em preventiva.

Por outro lado, o aumento significativo no quantum da sanção corporal para este crime acarretará o cumprimento da pena em regime inicial semiaberto, no mínimo.

Digo no mínimo porque, conforme regra expressa do Art. 33 e parágrafos do Código Penal, havendo em desfavor do agente circunstâncias judiciais desfavoráveis [Art. 59 do Código Penal], o Juiz pode impor, desde logo, regime inicial fechado para o cumprimento da sanção imposta, o que, até então, era algo quase impossível.

Já em relação ao crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, com a nova pena, o agente não mais terá direito à transação penal [Art. 76 da lei 9.099/95], suspensão condicional do processo [Art. 89 da lei 9.099/95], a competência para processar e julgar o delito não mais será do Juizado Especial, mas do Juízo Comum, bem como a sanção, caso haja circunstâncias judiciais desfavoráveis, poderá ser cumprida em regime inicial semiaberto.

Enfim, através do poder legiferante emprestado aos seus representantes, o povo brasileiro, verdadeiro detentor do poder [Art. 1o, parágrafo único, da Constituição Federal], deu mais uma vez mostras de que não tolera a combinação explosiva álcool e direção.

Hoje é necessário conscientizar-se de que, na direção de veículo automotor, mais do que estar conduzindo-o de forma prudente, exige-se do condutor capacidade de reagir de forma hábil ao acidente, buscando evitá-lo.

Não cabe mais unicamente dizer e provar que estava certo, mas, sobretudo, que estava apto a evitar o resultado, até porque, convenhamos, todo condutor de veículo deve agir como garante, considerando omissão em impedir o resultado penalmente relevante [Art. 13, parágrafo segundo, do Código Penal].

Registre-se que a nova lei possui vacatio legis de cento e vinte dias, quando, então, estará efetivamente em vigor.

Portanto, se beber não dirija mesmo!

ULISSES RABANEDA é advogado em Cuiabá.

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