BRENO ROSOSTOLATO
O projeto de lei Nº 2654 /2003, da deputada Maria do Rosário, prevê impedir o castigo físico em crianças e adolescentes e já foi aprovada na Câmara. A lei já é controversa e polêmica porque suscita discussões e dúvidas entre pais, cuidadores e educadores. Qual o limite para se dar uma palmada? O pai que der uma palmada no filho é criminoso? Existirão delegacias próprias para receber denúncias das crianças? Como será feita a fiscalização?
Não cabe a nós responder a tais perguntas. Deixaremos estas questões para nossos parlamentares, mas, enquanto sociedade, devemos discutir a palmada. Considero importante a iniciativa da lei partindo da premissa de que a reflexão sobre a violência infantil é o ponto primordial desta lei, uma vez que temos inúmeros casos de maus- tratos às crianças.
A palmada não deve ser punitiva e sim educativa, esta reflexão é fundamental para esclarecermos alguns equívocos. A palmada serve para sinalizar à criança a informação mais importante das relações interpessoais, o “não”, informação tão necessária para que não se torne um adulto frustrado e que aprenda a reconhecer a impossibilidade de fazer certas coisas. O ensinamento acontece mediante a associação da palavra com a palmada. A palmada muitas vezes complementa a palavra que não é assimilada pela criança. A palmada com explicação é eficaz, revelando ao filho que existe um não, e assim, instrumento de educação utilizado em momentos pontuais: birra, teimosia, etc. Sou enfático em afirmar que o diálogo deve ser considerado o principal vínculo entre pais e filhos. A palmada não é e não deve ser unânime para se educar uma criança.
A prerrogativa de que uma criança que recebe uma palmada se tornará um adulto violento me parece pouco consistente, pois não conheço criança violenta por causa de uma palmada, mas sim porque era espancada e apanhava violentamente, e é neste ponto que paira a distorção desta lei. Pais que não sabem diferenciar um espancamento de uma palmada devem, no mínimo, repensar sua condição de cuidadores e rever suas condições de orientadores. Além disso, a lei da palmada é insuficiente porque se limita a discutir as violências físicas e ignora as violências verbais e que comprometem emocionalmente da criança. Este tipo de agressão possui efeitos nocivos à constituição da personalidade da criança.
Parece-me evidente a intervenção do Estado Moderno na coparticipação na educação dos filhos com imposições de leis como estas. Todavia, a família que deveria ser o cerne das transformações na educação desta criança é desqualificada, diminuindo sua importância e participação. Proibir uma conduta deve implicar em demonstrar outras maneiras de agir e, neste aspecto, vivemos a perda da autonomia na família, assim como a maternidade e a paternidade são questionadas e colocadas à prova.
A política de tolerância zero visa transformar a animalidade em humanidade, o que é louvável, mas imediatista no que diz respeito a rediscutir este momento das relações familiares e deste novo momento das crianças e adolescentes. O afeto e o respeito são salvadores, o que de fato estamos perdendo cada vez mais no mundo e crime é não resgatarmos estes sentimentos.
BRENO ROSOSTOLATO é psicólogo e professor da Faculdade Santa Marcelina.
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