SÉRGIO RODAS
DO CONSULTOR JURÍDICO
Para o juiz federal Sergio Moro, hipótese de investigação adotada pelo Ministério Público basta para definir a competência de juízo. Assim, como o Ministério Público Federal afirma que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria “o arquiteto” do esquema de corrupção que ocorria na Petrobras, e dele teria se beneficiado indevidamente, a 13ª Vara Federal de Curitiba é competente para processar esses casos, pois concentra os processos em primeira instância da operação “lava jato”.
Com esse entendimento, Sergio Fernando Moro, titular dessa vara curitibana, julgou nesta terça-feira (16/8), ser inadmissível a Exceção de Incompetência apresentada pela defesa de Lula. Nesta peça, os advogados José Roberto Batochio, Roberto Teixeira e Cristiano Zanin Martins alegaram que os fatos imputados ao ex-presidente Lula — palestras irregulares e titularidade de um apartamento em Guarujá (SP) e de um sítio em Atibaia (SP) — não têm nada a ver com a capital paranaense ou com a Petrobras, para justificar a permanência dos processos com Moro.
"Assim como um acusado não ter o direito de escolher quem será o juiz de seu caso, um juiz não pode escolher quem ele quer julgar", afirma Batochio.Em Resposta à Exceção de Incompetência, o MPF opinou que as tentativas de desmembramento dos processos da "lava jato" são subterfúgios para minar as apurações.
“Desmembrar esse caso em inúmeros subcasos seria o mesmo que dividir o retrato de uma pessoa em inúmeras partes e depois esperar que o julgador, vendo apenas um pedaço da face de alguém (como uma orelha), diga a quem pertence”, afirmou o órgão, para quem Sergio Moro é competente para conduzir as investigações e processos que envolvam o petista.
Ao julgar a exceção, o juiz paranaense afirmou que a hipótese do MPF, que vincula Lula ao esquema de corrupção na Petrobras, é suficiente, nessa fase, para fixar a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba – que, de acordo com ele, é prevento para julgar as irregularidades ocorridas na estatal. E essa atribuição, a seu ver, foi respaldada pelo Supremo Tribunal Federal ao enviar a Moro as investigações contra Lula quando ele perdeu o foro por prerrogativa de função que havia adquirido por virar, brevemente, ministro da Casa Civil antes que a presidente Dilma Rousseff fosse afastada.
A defesa de Lula, em nota, afirmou que em nenhum momento o STF definiu que a 13ª Vara Federal de Curitiba seria competente para conduzir as investigações relacionadas ao petista. "Houve apenas a devolução dos processos à instância de origem após a exoneração de Lula para o cargo de ministro de Estado. Na decisão proferida em 13/06/2016, o Ministro Teori Zavascki afirmou que “outros questionamentos (...) não enfrentados por fugirem ao objeto específico da reclamação, inclusive acerca da competência do juízo de primeiro grau”.
Moro, portanto, desrespeita o STF ao modificar o conteúdo de decisões daquela corte para defender a competência da vara de Curitiba", sustentaram os advogados. O criminalista José Roberto Batochio criticou a decisão à ConJur.
“Atibaia e Guarujá ficam no Estado de São Paulo, e o Instituto Lula fica na capital paulista. Não há por que o caso de Lula ir para Curitiba”. Mesmo assim, ele disse que a decisão já era esperada, e que os advogados do petista recorrerão dela.
Momento processual
Outro argumento usado por Sergio Moro para negar o pedido da defesa de Lula foi o de que a Exceção de Incompetência só pode apresentada no “prazo da defesa”, de 10 dias após o recebimento da denúncia, estabelecido pelo artigo 108 do Código de Processo Penal. Uma vez que os inquéritos contra o ex-presidente não foram concluídos, muitos menos houve oferecimento de denúncia, a exceção é inadmissível nesse momento, sustentou o juiz da “lava jato”.
Novamente, Batochio discordou da análise de Moro, e defendeu a possibilidade de se apresentar exceção de incompetência durante a fase de investigações. “E se o juiz for inimigo do réu e puder decretar prisão cautelar dele? Como fica a situação do acusado? Se o juiz pode suprimir a liberdade do investigado, este pode arguir a incompetência dele. Caso contrário, estaria indefeso”, declarou o ex-presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
Exceção de Suspeição
Os advogados de Lula também afirmaram que Sergio Moro "mais uma vez assumiu o papel de acusador ao afirmar na decisão que 'não houve ainda denúncia'" contra o líder do PT. "A formulação de denúncia cabe exclusivamente ao Ministério Público Federal, a quem compete valorar os elementos da investigação.
Em julho de 2016, o procurador da República Deltan Dallagnol afirmou à Rádio Bandeirantes que ele e Moro são 'símbolos de um time', indicando a ausência de separação entre a função de acusador e de juiz", avaliaram Batochio, Teixeira e Zanin Martins na nota. Outro trecho que, segundo eles, coloca Moro como acusador é quando o juiz diz que a "hipótese acusatória" coloca o ex-presidente como “arquiteto do esquema criminoso”.
Para os advogados, "a acusação não é suportada por qualquer elemento concreto. Além disso, trata-se do reconhecimento de que há duas investigações em curso, simultaneamente, para apurar os mesmos fatos (bis in idem)– já que o Procurador-Geral da República requereu a mesma apuração no âmbito do Inquérito 3.989, que tramita no STF".
Por ter acusado Lula de obstruir a Justiça e ter manifestado apoio à tese dos investigadores da operação “lava jato” de que ele é o real proprietário de um sítio em Atibaia, a defesa do petista apresentou Exceção de Suspeição contra Sergio Moro no início de julho. Contudo, o juiz federal negou essas acusações e não abriu mão do caso.
Em face dessa negativa, a defesa do petista protocolou uma petição no Conselho de Direitos Humanos da ONU no dia 28 de julho, afirmando que o responsável pelos processos da operação “lava jato” em Curitiba está agindo com parcialidade.
Direito ao silêncio
Ainda nesta terça, a mulher de Lula, Marisa Letícia, e o filho deles Fábio Luís Lula da Silva não compareceram a depoimento na Polícia Federal.
Eles haviam sido convocados para prestar esclarecimentos sobre as reformas do sítio de Atibaia, atribuído ao petista. Porém, essa falta não pode dar ensejo à condução coercitiva deles, ressaltou Batochio. Para ele, a recusa deles em depor é legítima, e assegurada pelo artigo 5º, LXIII, da Constituição (que estabelece o direito de o investigado permanecer calado), e pelo artigo 206 do Código de Processo Penal (que permite que a testemunha negue depor contra seu familiar).
Em março, Lula foi conduzido coercitivamente para prestar depoimento à PF. Na ocasião, ao levar o petista sem tê-lo intimado antes, a PF violou o Código de Processo Penal e o próprio mandado no qual Sergio Moro autorizou a ação. Neste documento, o juiz deixava claro, em letras maiúsculas, que o “mandado só deve ser utilizado e cumprido caso o ex-presidente, convidado a acompanhar a autoridade policial para depoimento, recuse-se a fazê-lo”.
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