AIRTON MARQUES
DA REDAÇÃO
O advogado criminalista Eduardo Mahon defendeu a adoção de medidas para que juízes e promotores de Justiça sejam punidos em eventuais práticas ilícitas no decorrer de suas funções, como abuso de autoridade.
A possibilidade de punição pelo crime de responsabilidade de tais agentes públicos está prevista em uma das emendas que compõe o projeto de lei referente ao pacote anticorrupção, proposto pelo Ministério Público Federal. As emendas foram inseridas por parlamentares, fato que gerou revolta no Ministério Público e na magistratura.
O texto foi aprovado na madrugada desta quarta-feira (30), na Câmara Federal, e segue para a apreciação do Senado.
“Existem juízes traficantes, existem desembargadores traficantes. E qual é a punição deles quando vão presos? Eles são aposentados compulsoriamente, ficam algum tempo na cadeia, mas ganhando R$ 30 mil”.
Existem juízes traficantes, existem desembargadores traficantes. E qual é a punição deles quando vão presos? Eles são aposentados compulsoriamente, ficam algum tempo na cadeia, mas ganhando R$ 30 mil
Segundo o advogado, a proposta aprovada pelos deputados federais é positiva, pois alguns erros e injustiças devem ser corrigidos.“A pessoa é aposentada compulsoriamente e fica recebendo R$ 30 mil? Isso é que precisa mudar. Aposentadoria compulsória não garante nada. É só um benefício. O que não é possível são juízes acusados e punidos por corrupção terem aposentadoria compulsória. Isso para mim é agressivo”, disse Mahon.
“Hoje, quando um magistrado ou promotor se excede de alguma maneira, quem é responsabilizado é o Estado ou a União. Isso é injusto, pois o cidadão paga duas vezes. Primeiro, com uma eventual nulidade do processo, e segundo, vai pagar indenização gerada por um ato de um promotor e de um juiz”, declarou.
“Não vejo problema em responsabilizar a todos: procuradores, delegados, promotores, juízes e advogados. Quem tem medo de ser responsabilizado?”, questionou.
Mahon defendeu que a responsabilização não interfere na liberdade de julgamento, nem tampouco retira qualquer atribuição constitucional.
Além disso, o criminalista ressaltou que a lei de abuso de autoridade é antiga e precisa de mudança urgente, incluindo a tipificação de novas modalidades de abusos que, de acordo com ele, acontecem todos os dias.
“Essa emenda não prejudica o combate à corrupção, até porque as eventuais ações, hoje tipificadas como crimes, são anteriores. Pelo principio da não retroatividade da lei penal, estão a salvo. Mas, venhamos e convenhamos, temos uma lei de abuso de autoridade de 1965”, afirmou.
“Li as medidas e não são todas ruins. Alguns pontos são inconstitucionais, e, inclusive, atentam contra o poder de ação do próprio Ministério Público. No entanto, em sua maioria, as medidas são muito boas. A proposta ainda irá passar por um processo de amadurecimento no Senado. Agora, uma coisa é certa, os agentes políticos precisam ser responsabilizados”, declarou.
Do texto original, foi excluída a figura do “reportante do bem” e o fim da prescrição de crimes relacionados a desvios de recursos públicos. Os parlamentares rejeitaram também a criação do crime de enriquecimento ilícito de servidores públicos, a possibilidade de suspensão dos diretórios de partidos políticos e dirigentes em casos de corrupção e a inclusão de mudanças nos acordos de leniência e o acordo penal.
Fora de tempo
Mahon, no entanto, disse que a emenda que prevê a responsabilização de juízes e promotores pode ter sido aprovada em um momento errado, já que a questão deveria ser discutida fora do pacote de combate à corrupção.
“Acho que a título de ‘time’ [tempo] ela pode não ter sido conveniente, pois estavam debatendo a corrupção e misturaram com responsabilidade de agentes políticos. É preciso separar uma coisa da outra. Mas que agentes políticos e advogados precisam ser responsabilizados, por que não? Quem tem medo?”, disse.
O advogado explicou que as classes de membros do MPE e da magistratura não têm o que temer, pois são os próprios quem terão a tarefa de denunciar e, posteriormente, julgar os possíveis crimes caso a emenda seja colocada em vigor.
“Se forem responsabilizados, quem vai entrar com ação não são os advogados, é um promotor. E quem vai julgá-los é um juiz. Juízes e promotores estão com medo dos colegas?”, questionou.
“Infantil”
Na quarta-feira, os procuradores da Operação Lava Jato afirmaram que podem renunciar coletivamente caso a proposta de abuso de autoridade entre em vigor, foi infantil.
Para Mahon, este posicionamento dos agentes é "infantil".
“Se vitimizar, dizendo que vão abandonar o cargo e a operação me parece uma forma de chantagem infantil. Pois o processo legislativo é controlado não pelo Ministério Público, e sim pelos parlamentares. Ministério Público não nos representa. Quem representa a sociedade brasileira é o Congresso Nacional, por pior que alguns sejam”, afirmou.
Mahon também criticou a repercussão entre juízes e promotores em Mato Grosso.
“Vejo de forma muito negativa e infeliz. Como a política está sendo deslegitimada, algumas instituições estão assumindo o lugar das outras, fazendo uma caça às bruxas”, pontuou.
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