LAURA NABUCO
DA REDAÇÃO
Funcionário da Caramuru Alimentos S/A e acusado de envolvimento na fraude a um processo administrativo tributário que beneficiou a empresa, Walter de Souza Júnior afirmou, em depoimento à Delegacia Fazendária (Defaz), que temeu ser “dopado” pelo agente de tributos André Fantoni, apontado como articulador do esquema alvo da Operação Zaqueus.
Aos policiais da Defaz, Walter afirmou que, durante uma reunião com Fantoni, em setembro do ano passado, recusou duas bebidas oferecidas pelo agente porque as garrafas estavam abertas. Sua preocupação era que alguma outra substância tivesse sido misturada aos líquidos.
"No transcorrer dessa reunião o interrogando [Walter] percebeu que André Fantoni ofereceu uma cerveja já aberta para o interrogando beber, o que deixou o interrogando receoso e acabou por não aceitar; que, com a recusa da cerveja, André Fantoni pediu ao garçom uma água ao interrogando e, da mesma forma, esta estava aberta, motivo pelo qual novamente não aceitou a bebida, eis que acreditou que André pudesse ter colocado algo nas bebidas a fim de que o interrogando lhe contasse algo a mais da empresa Caramuru", diz trecho do depoimento.
Walter, Fantoni e outras cinco pessoas respondem a ação penal por fraude na redução do valor de uma multa tributária aplicada à Caramuru. De acordo com as investigações, a empresa pagou propina de R$ 1,8 milhão para ter a penalidade reduzida de R$ 65,9 milhões para R$ 315 mil.
Além deles, foram denunciados os também agentes de tributos Alfredo Menezes de Mattos Júnior e Farley Coelho Moutinho, os advogados Sandra Mara de Almeida e Themystocles Figueiredo (delator do caso) e o empresário Alberto Borges de Souza. Fantono e Alfredo estão presos.
Segundo o depoimento de Walter, a reunião em que Fantoni lhe ofereceu as bebidas ocorreu quando surgiram as primeiras suspeitas quanto aos pagamentos que a Caramuru fazia ao escritório de advocacia de Themystocles, “contratado” para lavar o dinheiro da propina.
No transcorrer dessa reunião o interrogando [Walter] percebeu que André Fantoni ofereceu uma cerveja já aberta para o interrogando beber, o que deixou o interrogando receoso e acabou por não aceitar; que, com a recusa da cerveja, André Fantoni pediu ao garçom uma água ao interrogando e, da mesma forma, esta estava aberta, motivo pelo qual novamente não aceitou a bebida
No mesmo dia, de acordo com o relato, o funcionário da Caramuru esteve com o delator do esquema. Na oportunidade, Themystocles citou uma matéria do Midianews "sobre notas fiscais emitidas pelo escritório Figueiredo e Figueiredo Advogados Associados em favor da empresa".
A preocupação do advogado era o fato de não ter como comprovar a oferta de um serviço que justificasse os valores recebidos. Ainda de acordo com Walter, foi nessa oportunidade que surgiu a ideia de elaboração de pareceres jurídicos falsos, que seriam apresentados como fruto do trabalho supostamente prestado pelo escritório à Caramuru.
"Então, ficou definido nessa reunião que o interrogando [Walter] iria providenciar tais pareceres, tendo ainda na ocasião o interrogando oferecido a Themystocleso valor de R$ 500 mil para que ele mantivesse a história cobertura [SIC]dos pareceres fictícios, eis que se assim não agisse todos seriam presos. (...) Afirma que ofereceu esses R$ 500 mil oriundos de seu próprio patrimônio, porquanto ficou desesperado com a possibilidade de todo esse esquema vir à tona", consta no depoimento.
O assunto acabou se tornando pauta também da conversa que Walter teve com Fantoni, horas mais tarde. O encontro entre eles ocorreu em um hotel de Cuiabá. Na oportunidade, segundo o funcionário da empresa, as bebidas foram servidas pelo garçom do estabelecimento. Mesmo assim, o fato de estarem abertas fez Walter desconfiar e se recusar a bebê-las.
Walter, no entanto, não foi o único a se sentir ameaçado por Fantoni. Também em depoimento à Defaz, Themystocles afirmou que o agente tentou lhe intimidar ao relatar que Alfredo Menezes “estaria querendo matar o funcionário da empresa Caramuru”.
As afirmações do advogado foram um dos argumentos que sustentaram a decisão da juíza Selma Arruda, da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, que decretou a prisão preventiva dos três agentes de tributos. O único solto até o momento foi o agente Farley Coutinho.
O esquema
As investigações da Defaz resultaram na deflagração da operação Zaqueus, no início de maio. Segundo o apurado, os agentes tributários André Fantoni, Alfredo Menezes e Farley Moutinho receberam propina de R$ 1,8 milhão para reduzir a aplicação de uma multa à empresa Caramuru Alimentos S/A de R$ 65,9 milhões para R$ 315,9 mil.
Enquanto Fantoni teria arquitetado a fraude e ficado responsável pelo contato com representantes da Caramuru, Alfredo Menezes e Farley Moutinho foram os julgadores do processo em questão em primeira e segunda instâncias administrativas, respectivamente.
O esquema chegou ao conhecimento dos investigadores após o advogado Themystocles Figueiredo procurar a Defaz para negociar uma delação premiada. As afirmações dele é que serviram como base para os mandados de prisão preventiva contra os três agentes de tributos.
Até o momento, somente Farley teve habeas corpus julgado favoravelmente pelo Tribunal de Justiça. Fantoni e Alfredo Menezes permanecem detidos.
No início desta semana, a juíza da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, Selma Arruda, recebeu a denúncia do MPE relacionada à operação.
Os três servidores vão responder pelos crimes corrupção passiva, lavagem de dinheiro e fraude processual. André Fantoni responderá ainda por coação no curso do processo, estelionato e associação criminosa. Esta última acusação também será aplicada no caso de Alfredo Menezes.
Já Walter de Souza Júnior vai responder por corrupção passiva, fraude processual, estelionato e lavagem de dinheiro. O empresário Alberto Borges de Souza, por sua vez, responderá por lavagem de dinheiro.
A advogada Sandra Mara de Almeida foi acusada de corrupção passiva e estelionato. E o advogado Themystocles Figueiredo, colaborador da Justiça, responderá por lavagem de dinheiro.
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