DA REDAÇÃO
O o promotor José Antônio Borges, presidente da Associação Mato-Grossense do Ministério Público no período em que foram emitidas cartas de crédito supostamente irregulares aos membros da instituição, negou qualquer ilegalidade no ato.
Foi a entidade de classe quem saiu no mercado à procura de uma empresa que pudesse intermediar a negociação dos documentos, entre os anos de 2008 e 2009.
Para ele, a CPI da Assembleia que investiga a emissão tem cunho político, já que a comissão foi instaurada no momento em que o MPE adotou várias medidas para investigar deputados.
Vejam que a CPI teve seu início de forma orquestrada, quando em depoimento na CPI das obras da Copa
"Não tenho dúvidas que a CPI foi uma retaliação ao ótimo trabalho desenvolvido pelos colegas no combate à corrupção", afirma o promotor.
Na opinião do promotor, existe um parlamentar que tem particularmente mais interesse em investigar o MPE. "O maior articulador e fomentador da CPI é, indubitavelmente, o deputado Wilson Santos", diz Borges.
"E ele não esconde de ninguém que tem uma enorme mágoa do Ministério Público em razão de abertura de procedimentos e ações onde ele figurou ou figura como investigado ou réu".
MidiaNews - No ano passado, a Assembléia Legislativa instaurou a CPI das Cartas de Crédito do Ministério Público. O senhor, na época da expedição dessas cartas, era o presidente da associação de classe e, como tal, as negociou. Como o senhor vê as acusações de irregularidades?
José Antônio Borges - De fato, à época, ocupava o cargo de presidente da AMMP e a Procuradoria já havia decidido, a pedido dos membros, expedir as cartas de crédito referentes a férias não gozadas e que eram passíveis de indenização, mas não se tinha disponibilidade financeira para a sua quitação.
Então, um grupo de promotores e procuradores buscou a sua entidade de classe e pediu que a negociação dessas cartas no mercado fosse feita pela Associação, a fim de evitar que cada um fosse pessoalmente negociar a sua.
E assim foi feito. Me recordo de que fizemos pesquisas e descobrimos que haviam empresas que intermediavam essa captação de cartas de crédito para vendas às empresas interessadas, o que nos levou a contratação da Ortolam Assessoria Tributária, a qual logrou êxito em negociar as cartas com a Rede Cemat.
MidiaNews - E quanto as acusações?
José Antônio Borges - Toda CPI tem motivação política e essa não foi diferente. À época de sua criação, é fato público que várias operações foram deflagradas e envolviam direta ou indiretamente membros do Parlamento, tais como a Operação Metástase, Célula Mãe e Ventríloquo. Não tenho dúvidas que a CPI foi uma retaliação ao ótimo trabalho desenvolvido pelos colegas no combate à corrupção.
Vejam que a CPI teve seu início de forma orquestrada, quando em depoimento na CPI das obras da Copa, veio uma pergunta do deputado Wilson Santos ao ex-secretário de Fazenda [Éder Moraes], sem qualquer sentido ou correlação com aquela investigação e, em seguida, a resposta de pronto e provocativa. Ali começava a CPI do MPE.
Tudo o que a CPI tem se baseia em relatório técnico feito por auditores do TCE e que encontraram erros formais na departamento de gestão de pessoas do Ministério Público. Mas em momento algum apontaram se houve erro no cálculo, dos valores devidos a cada membro, para mais ou para menos.
Não se deram ao trabalho de fazer a simples conferência, dos procedimentos individuais de cada pedido de férias, um a um dos beneficiários das cartas de crédito
Na última oitiva procedida pela CPI na tarde do dia 31 de maio, do procurador de contas, doutor Willian Brito Júnior, tudo ficou muito bem esclarecido, na medida em que ele afirmou em alto e bom som que as adjetivações genéricas proferidas no relatório técnico dos auditores do TCE, sem que houvesse o aprofundamento da questão por eles mesmos, deu azo a interpretações equivocadas.
Isso porque, segundo o procurador deixou claro, tal procedimento não é usual no TCE, uma vez que, na medida em que se tem uma dúvida, é dever do auditor ir a fundo para descobrir se houve má-fé ou desvio de recursos públicos, bem como levantar quem foi seu autor. Mas estranhamente isso não foi feito.
MidiaNews - Porquê o senhor diz "estranhamente"?
José Antônio Borges - Limitaram os auditores a pinçar, nos documentos verificados, rascunhos feitos por servidores em casos antigos - da década de 80 e 90, em que sequer haviam computadores no órgão - que apenas serviam para facilitar o manuseio de informações, mas que não eram, efetivamente, os dados concretos e inclusive publicados sobre a vida funcional de cada membro. Sobre isso fizeram um estardalhaço.
Não se deram ao trabalho de fazer a simples conferência, dos procedimentos individuais de cada pedido de férias, um a um dos beneficiários das cartas de crédito.
Vejam que, quando um promotor pede férias é formado um procedimento ao qual se anexa uma informação do DGP [Departamento de Gestão de Pessoas] com os períodos aquisitivos que ele tem direito de serem gozados, sendo que posteriormente vai à análise da Corregedoria para se verificar se há substituto legal que possibilite a saída. E finalmente vai ao procurador-geral de Justiça, que a defere ou não. Tal decisão é necessariamente publicada no Diário Oficial.
Assim, bastava aos auditores verificar quantos procedimentos de férias desse tipo existiam em relação a cada membro e subtrair o resultado pelos períodos de férias a que ele tem direito. Facilmente se chegaria a quantidade de férias não gozadas e que ensejariam indenização. Simples assim.
E sou ciente de que a administração superior do Ministério Público fez inúmeras checagens nesses cálculos e nada de errado encontraram, razão pela qual tenho convicção de que a CPI apenas atestará a regularidade de tudo, ao final, se trabalhar de forma imparcial.
MidiaNews - Se essas informações são meramente técnicas e de fácil compreensão, como o senhor diz, existe algum outro motivo que justificasse a prorrogação da CPI por mais 180 dias?
José Antônio Borges - Temos visto, pelas explanações públicas dos deputados, que o maior articulador e fomentador da CPI é, indubitavelmente, o deputado Wilson Santos. E ele não esconde de ninguém que tem uma enorme mágoa do Ministério Público em razão de abertura de procedimentos e ações onde ele figurou ou figura como investigado ou réu.
E temos notado, igualmente, em seus pronunciamentos, que o nobre deputado procura a todo tempo desviar o foco do que a CPI está de fato a investigar, para contestar os direitos e garantias obtidos a duras penas pelos membros do Ministério Público nacional.
Basta ver que ele sempre vocifera que nós possuímos verbas indenizatórias e dois períodos de férias, dando a entender que isso seria um absurdo, insuflando a população contra o Ministério Público e se esforçando em desgastar nossa imagem.
Contudo o mais interessante é que ele não fala que possui os mesmos direitos como agente político, e verbas indenizatórias muito superiores as nossas. Possem uma VI genérica de R$ 65 mil e outra de R$ 12 mil para gastos com combustíveis, além de outra verba para publicidade, da qual desconheço o valor.
não é retirando parte da fatia do orçamento dos demais poderes e órgãos que se vai resolver o impasse da RGA
Apenas a de combustível supera em quase 50% todas as nossas verbas indenizatórias mensais somadas.
Também o nobre deputado não diz que os dois períodos de férias que nos são garantidos desde 1993 pela Lei Orgânica Nacional do MP, são idênticos aos dos juízes, defensores públicos e outras carreiras jurídicas assemelhadas.
Por aí notamos que há a intenção de alguns parlamentares em manter a investigação em andamento, mesmo já sabendo de sua total improcedência, com o fito apenas de macular a imagem da Instituição e colocar em xeque nossas ações.
Mas garanto que isso não inibe nossas atitudes e apenas nos motiva a continuar firmes na defesa intransigente dos interesses da população, de forma responsável e técnica.
MidiaNews - O procurador-geral de Justiça, Paulo Prado, criticou o corte proposto pelo Executivo nos repasses ao MPE. Como isso pode afetar as atividades da Instituição?
José Antônio Borges - Sabemos que é perfeitamente compreensível que, na atual conjuntura econômica por que passa o Brasil, haja reflexos no Estado de Mato Grosso, em que pese não ter se notado, até agora, queda na arrecadação e até perspectiva de melhora para o próximo ano.
Também é factível que houve um crescimento vegetativo anormal na folha de pagamento do Poder Executivo, decorrente da implantação de diversos PCCSs no Governo passado, feitos sem o necessário estudo de impacto, conforme divulgado pelo próprio Executivo na imprensa.
Não há dúvidas que esse corte de 21%, ou mesmo de 15%, caso ocorra, dificultará enormemente, isso se não tornar inviável boa parte das atividades do Ministério Público, especialmente porque provocará uma demissão em massa de servidores e o fechamento de inúmeras sedes de Promotorias de Justiça no interior do Estado.
Entretanto, o que nós não conseguimos entender é essa fórmula encontrada pelo Executivo para que esse valor que seria revertido a ele dos poderes e órgãos, seja utilizado no pagamento do RGA dos servidores públicos (justificativa utilizada para a propositura do corte) e que não mais haja infringência do limite legal de contratação de pessoal de 49% previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ora, os limites da LRF para o pagamento da folha são estabelecidos em percentuais da Receita Corrente Líquida e esta é uma só. Portanto, se o Estado tem uma receita de 10 bilhões de reais, o Executivo somente poderá gastar 4,9 bilhões com folha de pagamento.
Se todos os demais poderes e órgãos - que, em nosso Estado, tem direito a 17% do total da receita corrente líquida para gastos com pessoal, custeio e investimento - não recebessem um real que lhes é devido, o Poder Executivo teria em caixa mais 1,7 bilhão para gastar, mas o limite de gastos de pessoal continuaria o mesmo!
Em outras palavras, o Executivo teria dinheiro para gastar com obras e investimentos, mas não para pagar a RGA de seus servidores.
Então é importante que os servidores públicos e a população entendam que não é retirando parte da fatia do orçamento dos demais poderes e órgãos que se vai resolver o impasse da RGA e o extrapolamento do percentual da LRF para pagamento de pessoal pelo Executivo.
Em minha modesta opinião, a única saída para a resolução desse impasse, é o aumento da arrecadação, possivelmente através da criação de novos tributos, enxugamento da folha ou a revisão de eventuais PCCSs feitos sem respeito à legislação vigente.
MidiaNews - Quais serviços seriam os mais afetados no Ministério Público, em havendo o corte pretendido pelo Executivo?
José Antônio Borges - Não tenho a menor dúvida de que o primeiro setor a ser impactado pela falta de recursos e manutenção da estrutura é a de combate ao crime organizado, sonegação de impostos e desvios de recursos públicos, o que atingiria o próprio Poder Executivo.
Em apenas uma única ação cível contra a empresa JBS Friboi, logrou-se reverter aos cofres públicos a quantia de R$ 376 milhões
Note que o Ministério Público é um dos órgãos que mais auxilia o Governo na defesa do patrimônio público e recuperação de ativos desviados por empresas e maus gestores, afora outras áreas.
Apenas como exemplo, a nossa Promotoria de Defesa da Ordem Tributária e Crimes contra a Administração Pública, bem como o Núcleo do Patrimônio Público da Capital, que possuem a maior estrutura de funcionários e técnicos, sofreriam com a carência de pessoal, o que levaria a lentidão na tramitação dos procedimentos investigatórios e uma menor efetividade em suas produções.
Para se ter uma idéia, no final de 2015, em apenas uma única ação cível contra a empresa JBS Friboi, logrou-se reverter aos cofres públicos a quantia de R$ 376 milhões, praticamente equivalente ao orçamento de todo o Ministério Público daquele ano. Posso citar, também, o acordo feito na Ararath, com o empresário Júnior Mendonça, que aceitou pagar aos cofres públicos quase R$ 11 milhões.
Há centenas de milhões de reais em valores e bens apreendidos de maus gestores em ações penais propostas pelo Gaeco e pelas demais Promotorias Criminais do Estado todo, cujos valores serão revertidos aos cofres públicos.
Existem inúmeros TACs (termos de ajustamento de conduta) com beneficiamento ao Estado e a população, produzidos nas mais diversas áreas de atuação, como o meio ambiente, saúde, educação, idoso, probidade administrativa, criança e adolescente.
Me recordo, ainda como exemplos, um TAC por mim firmado junto à Secretaria de Trabalho e Assistência Social, referente a municipalização do Lar da Criança, que trará economia anual de cerca de R$ 3 milhões aos cofres do Estado.
Na área criminal os benefícios ao Estado aparecem igualmente na reversão aos cofres públicos dos bens oriundos do tráfico de drogas, através de leilões. A Terceira Promotoria Criminal de Cáceres, em 2015, conseguiu a realização um leilão de 2.300 cabeças de gado oriundas do tráfico, com reversão de mais de 10 milhões de reais ao erário.
Acredito que o impacto ao Estado será tão grande quanto ao Ministério Público, caso o corte ocorra. Creio que, da mesma forma, haverá enormes dificuldades na manutenção de estrutura dos demais Poderes e Órgãos atingidos pelo corte, especialmente o Judiciário, que tem enorme estrutura em todo o Estado para manter, pois, como o Ministério Público, está em cerca de 80 comarcas.
MidiaNews - Este ano haverá eleições para a escolha do novo procurador-geral de Justiça. Como está a expectativa na classe?
José Antônio Borges - A eleição se dará ao final deste ano e, afirmo, que esse é o último assunto que estamos a debater internamente, já que estamos unidos em torno do procurador-geral de Justiça, para encontrarmos caminhos para superar as dificuldades surgidas com a manutenção de nossa autonomia financeira.
Falar em eleição agora é até um desrespeito ao nosso chefe institucional, que ainda tem quase um ano de mandato pela frente.
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